Um erro cometido pelo governo em 2012, agravado pela crise da água em 2014, resultou nos recentes aumentos na conta de luz, dizem especialistas do setor de energia elétrica. Segundo o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), de janeiro a maio deste ano, a conta de luz subiu quase 42%, em média, no país.
E ainda vem mais aumento por aí. A Eletropaulo, que tem 6,7 milhões de clientes em 24 cidades na região metropolitana de São Paulo, incluindo a capital, informou que a tarifa vai subir mais 17,04% para casas a partir deste sábado (4). Com o aumento, a alta na conta dos clientes da Eletropaulo será de 75% em relação a dezembro de 2014.
O governo nega que tenha havido erro e diz que o problema foi a falta de chuva.
Aumentos foram autorizados pelo governo
Todos os aumentos foram autorizados pela agência reguladora do setor, a Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica). O acréscimo foi liberado devido aos aumentos nos custos das concessionárias para fornecer energia e ao sistema de bandeiras tarifárias, justificou o órgão.
As bandeiras indicam as condições de geração de energia. Quando são vermelhas (condições desfavoráveis), como está acontecendo desde janeiro, o consumidor paga R$ 5,50 a mais a cada 100 quilowatt-hora consumido. O valor de 100 quilowatt-hora é equivalente a uma lâmpada de 15 watts acesa por 278 dias.
O UOL conversou com especialistas para entender o que fez a conta subir tanto.
Reduzir a tarifa em 2012 foi errado, diz economista
Para Adriano Pires, professor de economia da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro) e fundador do Centro Brasileiro de Infraestrutura, o principal erro aconteceu em 2012, com a Medida Provisória 579, editada pelo governo federal e convertida na lei 12.783/2013. A MP permitiu que as empresas de energia renovassem seus contratos com o governo sem passar por novas licitações.
Mas havia uma condição: elas precisavam reduzir suas tarifas. Pareceu uma boa notícia para os consumidores, já que a conta cairia 20%. O problema é que o custo de produzir e transmitir energia subiu, e as empresas não conseguiram fechar suas contas. Elas ficaram endividadas, o que está piorando os aumentos nas contas verificados agora.
O Ministério de Minas e Energia nega que houve erro e diz que se não se tivesse havido redução de preço antes, agora o reajuste seria ainda maior.
Consumo aumentou e seca piorou a situação
"O nível dos reservatórios de água do país já estava baixo, e as usinas térmicas, mais caras, começavam a ser ligadas", diz Pires. "Mas o governo apostou que o consumo não ia crescer e que ia chover bastante para encher os reservatórios."
O consumo aumentou, e as chuvas em 2014 ficaram muito abaixo da média. Para compensar a perda na geração das hidrelétricas, o país passou a depender cada vez mais das usinas térmicas, a carvão.
Concessionárias de energia se endividaram
"Como as empresas não podiam subir as tarifas, o Tesouro Nacional emprestou dinheiro. O setor elétrico ficou com uma dívida de mais de R$ 100 bilhões", diz Pires.
Agora, com o ajuste fiscal (conjunto de medidas para reequilibrar as contas públicas), o governo está autorizando, por meio da Aneel, os aumentos nas tarifas.
"É a tragédia em que o governo meteu a população brasileira: as distribuidoras repassam o rombo para o consumidor, o que aumenta a inflação", diz Ildo Sauer, engenheiro e diretor do Instituto de Eletrotécnica e Energia da USP (Universidade de São Paulo).
Consumidor paga pelo risco do negócio, diz especialista
Para Wilson Roberto Villas Boas Antunes, vice-presidente do Conselho Federal de Economia e ex-diretor da Cesp, ao cortar as tarifas, em 2012, o governo impediu que as companhias embutissem os riscos do negócio nos preços.
"Antes, quando uma companhia ganhava uma concessão, ela previa prejuízos com 'gatos' [ligações elétricas clandestinas] e gastos com compra de energia térmica caso houvesse seca", diz. O preço da tarifa, diz ele, já incluía esses riscos.
"Hoje, as empresas ganham o direito de repassar esse risco inteiramente para o consumidor. Para a empresa, o setor elétrico no Brasil é um negócio sem risco", diz.
Para o governo, sem a MP 579, aumento neste ano seria maior
Procurado pelo UOL, o Ministério de Minas e Energia disse que o aumento neste ano foi devido, principalmente, ao período de seca e consequente acionamento das usinas térmicas. Disse, também, que as mudanças promovidas pela MP 579 continuam sendo benéficas para o consumidor.
"Caso não tivesse havido aquela redução, os aumentos recentes teriam incidido sobre uma base mais elevada, resultando em tarifas mais altas", afirmou.
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