quinta-feira, 25 de agosto de 2022

Assassinatos caem 5% no 1º semestre no Brasil; veja os estados com as maiores quedas

Foram 20,1 mil assassinatos nos primeiros seis meses deste ano. Mesmo assim, o número é elevado: em média, mais de 111 brasileiros foram assassinados por dia. Ferramenta criada pelo g1 acompanha os assassinatos mês a mês.

Da redação
Por Clara Velasco e Marina Pinhoni*, g1


O número de assassinatos no país continua em queda em 2022, segundo o índice nacional de homicídios criado pelo g1, com base nos dados oficiais dos 26 estados e do Distrito Federal.

Foram 20,1 mil assassinatos nos primeiros seis meses deste ano, o que representa uma queda de 5% em relação ao mesmo período do ano passado.

Mesmo assim, o número é elevado: em média, mais de 111 brasileiros foram assassinados por dia no primeiro semestre de 2022.

Estão contabilizadas no número as vítimas dos seguintes crimes:
  • homicídios dolosos (incluindo os feminicídios)
  • latrocínios (roubos seguidos de morte)
  • lesões corporais seguidas de morte
Em 2021, o Brasil teve uma queda de 7% no número de assassinatos, como apontou um levantamento exclusivo do Monitor da Violência. Foram 41,1 mil mortes violentas intencionais no país no ano passado, o menor número de toda a série histórica do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, que coleta os dados desde 2007.


Segundo especialistas do FBSP e do NEV-USP, o menor número de mortes é motivado por um conjunto de fatores, incluindo: mudanças na dinâmica do mercado de drogas brasileiro; maior controle e influência dos governos sobre os criminosos; apaziguamento de conflitos entre facções; políticas públicas de segurança e sociais; e redução do número de jovens na população.

Os dados do primeiro trimestre de 2022 apontam que:
  • houve aproximadamente 20,1 mil assassinatos nos primeiros seis meses deste ano, 1,1 mil mortes a menos que no mesmo período de 2021;
  • na contramão do país, sete estados registraram alta nas mortes: Minas Gerais, Piauí, Alagoas, Pernambuco, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul e Rondônia
  • Roraima teve a maior queda: 34%
  • Rondônia teve o maior aumento nos crimes: 24%
O levantamento, que compila os dados mês a mês, faz parte do Monitor da Violência, uma parceria do g1 com o Núcleo de Estudos da Violência da Universidade de São Paulo (NEV-USP) e o Fórum Brasileiro de Segurança Pública.

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Queda generalizada

Os dados apontam que todas as regiões do país tiverem queda nos indicadores de mortes violentas intencionais no início deste ano.
A queda mais expressiva foi a da região Sudeste, com uma diminuição de quase de 7,5%. Foram quase 393 mortes a menos, sendo que todos os estados tiveram queda, menos Minas Gerais (alta de 2%).

No Espírito Santo, por exemplo, o número de assassinatos no primeiro semestre foi o menor em 26 anos. Houve uma queda de mais de 16% em relação ao mesmo período do ano passado.

O Rio de Janeiro também teve uma queda expressiva: o número de mortes violentas passou de 1.810 no ano passado para 1.515 neste ano (-16%). Inclusive, em 2021, os homicídios dolosos atingiram uma baixa histórica no Rio, segundo o Instituto de Segurança Pública.

Segundo Paulo Storani, especialista em segurança pública, investimentos em policiamento ostensivo e em distribuição dos agentes pelo território urbano, além da realização de operações, podem ter contribuído para a queda.

Veja os estados com a maiores quedas:
  • Roraima: -34%
  • Distrito Federal: -21%
  • Rio Grande do Norte: -18%
  • Amapá: -17%
  • Maranhão: -17%
  • Espírito Santo: - 16,5%
  • Rio de Janeiro: -16%
  • Acre: -15%
  • Goiás: -14%
  • Bahia: -10%
Estados na contramão

Já no Nordeste, a queda foi de mais de 5% -- mas três estados da região tiveram alta, na contramão da queda nacional. São eles: Alagoas (6%), Pernambuco (10%) e Piauí (7%).


A mesma situação aconteceu no Centro-Oeste. No geral, houve uma queda de 4%, mas Mato Grosso e Mato Grosso do Sul tiveram altas de mais de 10% nas mortes.

O estado com a maior alta de violência no primeiro semestre deste ano, porém, está no Norte. Rondônia teve um aumento de 24% nos registros. Essa variação é mais baixa que a registrada no primeiro trimestre deste ano (alta de 43%), o que significa que o ritmo da violência diminuiu entre abril e junho – mas os indicadores continuam na contramão da tendência nacional de queda.

Em fevereiro, a morte de um casal integrante da Liga dos Camponeses Pobres (LCP) chamou a atenção do estado. Ilma Rodrigues dos Santos, de 45 anos, e o companheiro dela, Edson Lima Rodrigues, foram mortos a tiros em uma propriedade rural do distrito do Abunã, em Porto Velho. A caminhonete do casal foi incendiada por criminosos.


Em nota, o governo de Rondônia afirmou que "vem adotando medidas necessárias para reduzir o índice de violência, a exemplo de operações policiais integradas". "No período de janeiro a junho de 2022, houve mais de 90 prisões envolvendo líderes de organizações criminosas. Sendo que somente em junho, a Polícia Civil fez a prisão de 26 homicidas em operações específicas."

"Além das operações, ocorre um conjunto de fatores, como as constantes investigações, polícias trabalhando de forma integrada, intensificação do policiamento, uso da inteligência e operações integradas. Todas essas medidas resultaram, no mês de junho de 2022, em uma redução de 26% nos números de homicídios. Além disso, já construímos um termo de cooperação que está sendo analisada pro Ministério da Justiça, para que possamos trabalhar com as forças estaduais e federais, para que possamos monitorar melhor as organizações criminosas", afirma o governo.

Tipos de mortes e hipóteses de queda

Mesmo com os aumentos pontuais de violência em alguns estados, a queda no primeiro trimestre de 2022 aponta que o país está seguindo a mesma tendência nacional de 2021, quando o Brasil registrou uma baixa de 7% nos assassinatos.


Segundo Bruno Paes Manso, do NEV-USP, é difícil apontar hipóteses sobre as causas da variação dos indicadores de violência, mas é possível identificar algumas tendências. Ele afirma que existem diversos motivos por trás das ações dos homicidas.

"Há os assassinos ocasionais, que matam numa discussão de bar ou numa briga de trânsito, por exemplo. Muitas vezes, ficam cegos de ódio e só percebem depois que mataram e jogaram a própria vida fora por um motivo idiota."
"Há também os casos de feminicídios, vinculados a homens misóginos e machistas, que se sentem donos de suas mulheres e as assassinam porque se sentem ameaçados. Casos como esses são mais prováveis quando o agressor tem uma arma na mão."
"Existem, porém, um outro tipo de homicídio, com motivações diferentes, que costumam ser mais relevantes nas variações de curto prazo das curvas de violência. São os casos ligados a disputas no mercado criminal."

Paes Manso destaca que, quando gangues rivais brigam por poder ou mercado nos territórios, os homicídios costumam crescer.

"Cada assassinato tende a ser cobrado pelos parceiros da vítima, promovendo vinganças sucessivas, que acabam causando explosões nas taxas. Foi o que aconteceu em 2017, ano em que as duas maiores gangues do Brasil entraram em confronto dentro dos presídios. As rebeliões, que provocaram quase 200 mortes, foram para as ruas dos bairros de diferentes estados e o Brasil fechou aquele ano como o mais violento da história", diz Paes Manso.

O pesquisador afirma que, desde então, o cenário de criminalidade brasileiro está ano a ano menos violento -- o que não significa que o crime parou ou diminuiu. "Este ano, por exemplo, o Anuário do Fórum Brasileiro de Segurança Pública apontou a existência de pelo menos 53 facções atuando em todos os estados brasileiros, duas delas com dimensões nacionais", diz.

O pesquisador reforça que a queda não tem relação com o maior número de armas legalizadas em circulação.

"Tem surgido no debate o argumento de que a maior quantidade de armas tem ajudado a diminuir os homicídios, porque os homicidas se sentiriam coagidos pelo risco de da vítima reagir por estar armada. Isso é uma falácia, porque na verdade os latrocínios - que são os homicídios que resultam de um assalto - são uma parte muito pouco importante do total de homicídios em geral. Chegam a três ou quatro por cento dos casos. Então, os casos de homicídios envolvendo latrocínio são muito pequenos e, por isso, esse medo do ladrão que mata é muito pouco significativo em relação a outros tipos de homicídio."

Samira Bueno, do Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP), concorda que o fator que tem mais influenciado nas oscilações dos indicadores de violência no país é a dinâmica do crime organizado. "Isso é algo que precisamos entender melhor, bem como os riscos para a democracia de a gente ter facções de base prisional que tomaram o país", diz.
Os especialistas citam ainda outros fatores que podem estar por trás das quedas dos indicadores:
  • Criação de programas de focalização e outras políticas públicas: "Várias unidades da federação adotaram, ao longo dos anos 2000 e 2010, programas de redução de homicídios pautados na focalização de ações nos territórios. O Pacto Pela Vida, em Pernambuco, o Estado Presente, no Espírito Santo, e o Ceará Pacífico, no Ceará, são exemplos de projetos que buscaram integrar ações policiais e medidas de caráter preventivo", afirmam Samira Bueno e Renato Sérgio de Lima, do FBSP.
  • Redução do número de jovens na população: "Tem a ver com as mudanças demográficas, algo que a gente já vem apontando há alguns anos no Atlas da Violência, que é a reduçao do número de jovens na populacão. É sabido que a maior parte da violência letal atinge jovens do sexo masculino. E o Brasil esta diante de uma grande mudança demográfica", afirma Samira.
Índice nacional de homicídios

A ferramenta criada pelo g1 permite o acompanhamento dos dados de vítimas de crimes violentos mês a mês no país. Estão contabilizadas as vítimas de homicídios dolosos (incluindo os feminicídios), latrocínios e lesões corporais seguidas de morte. Juntos, estes casos compõem os chamados crimes violentos letais e intencionais.

Jornalistas do g1 espalhados pelo país solicitam os dados, via assessoria de imprensa e via Lei de Acesso à Informação, seguindo o padrão metodológico utilizado pelo fórum no Anuário Brasileiro de Segurança Pública.

O governo federal anunciou a criação de um sistema similar ainda na gestão do ex-ministro Sergio Moro. Mas os dados não estão tão atualizados quanto os da ferramenta do g1.

Os dados coletados mês a mês pelo g1 não incluem as mortes em decorrência de intervenção policial. Isso porque há uma dificuldade maior em obter esses dados em tempo real e de forma sistemática com os governos estaduais. O balanço fechado do ano de 2021 foi publicado em maio.

* Geisy Negreiros (g1 AC), Cau Rodrigues (g1 AL), Fabiana Figueiredo (g1 AP), Eliena Monteiro (g1 AM), João Souza (g1 BA), Marília Cordeiro e André Teixeira (g1 CE), Pedro Alves Neto (g1 DF), Maíra Mendonça (g1 ES), Vitor Santana (g1 GO), Rafaelle Fróes (g1 MA), José Câmara, Rafaela Moreira, Renata Barros, Thais Libni e Débora Teixeira (g1 MS), Pedro Mathias (g1 MT), Raquel Freitas e Rafaela Mansur (g1 MG), Taymã Carneiro (g1 PA), Dani Fechine (g1 PB), Letícia Paris (g1 PR), Pedro Alves, Priscilla Aguiar, Katherine Coutinho, Bruno Marinho e Ricardo Novelino (g1 PE), Maria Romero (g1 PI), Fernanda Zauli e Igor Jácome (g1 RN), Gabriela Clemente e Lilian Lima (g1 RS), Jonatas Boni (g1 RO), Samantha Rufino e Valéria Oliveira (g1 RR), Caroline Borges (g1 SC), Joelma Gonçalves (g1 SE), Vilma Nascimento e Patrício Reis (g1 TO).

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