Brasília (AE) - Assustado com a profundidade da crise internacional, o governo anunciou ontem um pacote com três medidas para estimular o investimento pelos Estados e assim reanimar a economia, que ficou praticamente estagnada no início do ano. "É uma ação anticíclica que nos deixará imunes ou, pelo menos, menos expostos", disse o ministro da Fazenda, Guido Mantega, após reunir-se, ao lado da presidenta Dilma Rousseff, com os governadores.
Antônio Cruz/ABr
Presidenta Dilma Rousseff reúne governadores dos Estados para anunciar um pacote de três medidas que têm como meta estimular os investimentos públicos
A principal medida foi a criação de uma linha de crédito no Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) no valor de R$ 20 bilhões, para financiar projetos de infraestrutura. O governo também decidiu estimular as Parcerias Público-privadas (PPP) nos Estados e municípios, barateando seu custo. O Tesouro Nacional autorizará ainda os governadores a aumentar seu nível de endividamento.
"Já melhora o clima", comentou o governador de Santa Catarina, Raimundo Colombo (PSD), questionado sobre a possibilidade de iniciar investimentos ainda este ano. Ele elogiou o fato de o empréstimo ter juro baixo, de 7,1%. Nessas operações, os Estados contarão com o governo federal como avalista. Caso queiram acelerar os trâmites e dispensar o aval, a taxa sobe para 8,1%.
O prazo de pagamento é de 20 anos, com um de carência. Os projetos terão de ser aprovados até o dia 31 de janeiro de 2013. O governo ainda vai definir os critérios para a divisão dos recursos, que serão fixados pelo Conselho Monetário Nacional (CMN) no final deste mês.
"Vai dar tempo", assegurou o governador do Espírito Santo, Renato Casagrande (PSB). Ele informou que já possui projetos prontos na área de mobilidade urbana e rodovias, e espera acessar até R$ 500 milhões. O governador de Sergipe, Marcelo Déda (PT), também afirmou que tem projetos prontos e só aguarda a definição de qual será a cota destinada a seu Estado.
A medida agradou até à oposição. "Não há dúvida de que terá um impacto muito positivo, porque ele vai permitir investimentos importantes em todos os Estados", comentou o governador de Minas Gerais, Antonio Anastasia (PSDB).
Apesar da expectativa de gerar efeitos ainda este ano, o próprio ministro Mantega reconheceu que isso pode acabar ficando para 2013. "Os Estados podem sacar até o fim do ano, mas eles têm que ter projetos. Depende da rapidez dos projetos", disse. "De qualquer forma, se não for este ano, será no início do próximo."
Economistas concordam que o pacote ajudará a impulsionar a economia, mas duvidam de efeitos no curto prazo. "Não é algo que acontece em 2, 3 meses porque precisa de processo licitatório, licença ambiental, há sempre contestação judicial", disse Mansueto Almeida, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea).
O governo decidiu também dar um impulso às PPPs, que não decolaram na área federal mas vêm sendo realizadas por Estados e municípios. Nelas, o setor público torna-se sócio de uma empresa privada para um empreendimento, como estádios, redes de saneamento e rodovias, por exemplo. Uma empresa privada constrói e explora, mas a receita que ela arrecada não é suficiente para cobrir os gastos, por isso ela recebe uma complementação do setor público, a chamada contraprestação.
Mantega anunciou ontem que as contraprestações pagas pelo setor público não serão mais consideradas como receita da empresa. Elas serão contabilizadas como um aporte de capital. Por isso, deixarão de recolher tributos como o Imposto de Renda e o PIS/Cofins. Isso deverá baratear o custo das PPPs. Além disso, os Estados foram autorizados a aumentar, de 3% para 5% a fatia de sua receita corrente líquida comprometida com o pagamento desses gastos.
Os Estados serão autorizados a tomar novos empréstimos, após a análise de suas contas pelo Tesouro. No ano passado, o governo os autorizou a tomar empréstimos novos, no valor total de R$ 40 bilhões.
Embora a assessoria houvesse preparado um material sobre reforma tributária, o assunto não foi tratado em detalhe na reunião de ontem. Dilma disse que a guerra fiscal é um problema grave que tem de acabar, e afirmou que o governo discutirá a questão na próxima reunião do Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz).
Governadores avaliam a nova linha de crédito do BNDES
As medidas de estímulo aos estados anunciadas pela presidenta Dilma Rousseff e pelo ministro da Fazenda, Guido Mantega, agradaram aos governadores e representantes das 27 unidades da Federação que se reuniram com a presidenta Dilma Rousseff no Palácio do Planalto. Uma das medidas anunciadas foi a criação da linha especial de crédito Pró-Investe, com R$ 20 bilhões para os estados. Também foram anunciados estímulos às parcerias público-privadas (PPPs). Será reduzida a tributação do pagamento que os estados fazem para remunerar os investimentos realizados pela iniciativa privada nesse tipo de pareceria.
O governo federal decidiu também iniciar uma nova etapa do Programa de Ajuste Fiscal , que examina a conta dos estados. Aqueles que apresentarem resultados fiscais sólidos passam a ter direito de autorização por parte da União a obter créditos para novos investimentos.
O governador do Ceará, Cid Gomes, contou que, na reunião, a presidenta destacou a necessidade de investimento público, principalmente em obras de infraestrutura, e de estímulo ao consumo, com responsabilidade, no atual momento de crise econômica internacional. "A iniciativa privada acaba se recolhendo, em momentos como este", disse.
Para o vice-governador de São Paulo, Guilherme Afif Domingos, a mudança sobre as PPPs é a medida de maior relevância. "O que importa para São Paulo não é a repartição de empréstimo. É a desoneração das nossas PPPs", disse.
"É um passo muito importante o fato de se desonerar o investimento de obras de interesse social no caso das PPPs. Quando faço saneamento - qualquer estado - pago 30% de impostos federais, e esse conceito acaba de ser desonerado", acrescentou Afif. Para ele, a medida relacionada às PPPs "traz um forte atrativo" para o investimento. "Interessa ao governo distribuir o investimento com mais velocidade", ressaltou o vice-governador.
O governador do Rio Grande do Sul, Tarso Genro, apontou a desburocratização para obtenção do empréstimo como um fator positivo do pacote. "Há uma enorme satisfação de todos os governadores, porque será um empréstimo liberado sem a burocracia tradicional, e o objetivo são obras que impulsionem o desenvolvimento, gerem crescimento econômico e maior distribuição de renda no país, vinculadas ao desenvolvimento regional."
Rosalba propõe critério de distribuição
A governadora Rosalba Ciarlini apresentou uma proposta para a distribuição dos R$ 20 bilhões que o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social vai disponibilizar no financiamento de infraestrutura nos Estados. Rosalba disse que defendeu, na reunião da presidenta Dilma Rousseff com os governadores, que R$ 10 bilhões sejam distribuídos igualmente como os 27 Estados e a outra parte de acordo com os critérios do Fundo de Participação, o que beneficiaria as unidades da federação mais pobres.
"Seria uma forma mais justa", afirmou a governadora. Ela disse que se não forem adotados esses critérios, ou algum modelo semelhante, a tendência é os estados mais ricos ou com maior influência política ficarem com a maior parcela dos recursos.
Segundo Rosalba Ciarlini, governadores de outros estados, como os de Tocantis, Alagoas, Ceará e Acre apoiaram a sugestão.
Se o critério apresentado pela governadora do RN for adotado pelo Governo Federal na distribuição da linha de financiamento, o Rio Grande do Norte poderá receber créditos que ficariam entre R$ 800 milhões e R$ 1 bilhão. "Temos capacidade de endividamento e projetos prontos, alguns com licença ambiental", afirmou Rosalba, pouco depois de encerrada a reunião com Dilma Rousseff.
A governadora disse que a presidenta informou que o financiamento será para obras de infraestrutura. As condições são diferenciadas: Um ano de carência, incidência mensal da TJLP (Taxa de Juros de Longa Prazo), mais 1%, no caso da operação com garantia concedida pelo Governo federal. "Também sugeri dois anos de carência, um é pouco", disse Rosalba.
Ela assegurou que o governo do Estado está preparado para aproveitar plenamente as oportunidades que podem surgir com as novas linhas de crédito. "Temos projetos elaborados em áreas como saneamento básico e estradas, alguns até com licenciamento ambiental", destacou.
Os financiamentos que o BNDES vai conceder aos estados integram as medidas do governo federal para enfrentar a retração na economia. Segundo Rosalba, a presidenta demonstrou preocupação com a crise internacional e a implicação no Brasil. O pacote com a nova linha de crédito faz parte das medidas para enfrentar essa circunstância econômica desfavorável.
Presidenta não vê "luz no fim do túnel"
"Com o aproximar da eleição na Grécia, eu diria aos senhores que a luz no final do túnel não está acesa". Foi com essa franqueza que a presidenta Dilma Rousseff traçou um panorama da crise econômica internacional na reunião com governadores ou vice-governadores dos 27 Estados do País. Ela avaliou que a situação na Europa tende a agravar-se.
"Estamos todos de olho naquilo que pode ser o pior: o período pós-eleitoral da Grécia", disse Dilma. "Se me permite, presidenta, há, sim, luz no fim do túnel", respondeu o ministro da Fazenda, Guido Mantega. Todos os presentes pararam para ouvi-lo. "Só que é uma locomotiva vindo em sentido contrário." Ele se referia aos impactos da crise sobre as chamadas economias emergentes.
Em contraste, após reunir-se com governadores a presidenta recebeu os atletas que participarão da Olimpíada de Londres e garantiu que o País vai merecer medalha pelo crescimento econômico. "Você vai ver se não vai merecer. Nós estamos no esquentamento", disse ela, simulando um exercício com halteres, brincando com os esforços do governo para reaquecer a economia.
Em sua explanação aos governadores, Dilma assegurou que o País está mais preparado para enfrentar a atual crise do que estava em 2009. Na rodada anterior, o Brasil vinha de um período de baixo crescimento. Não é o caso agora. Além de a economia estar em melhores condições, o governo vem agindo para se proteger dos efeitos da turbulência internacional.
Como vem fazendo nas últimas semanas, a presidenta defendeu as medidas de estímulo ao consumo. Segundo alguns analistas, essa via estaria esgotada, dado o alto nível de endividamento das famílias brasileiras. Dilma rebateu essa avaliação. "Temos uma demanda reprimida de consumo, não podemos cair nesse viés elitista de pensar em restrição do consumo, desde que saibamos equilibrar consumo com investimento." Dilma também defendeu as medidas de proteção ao mercado nacional, como a taxação extra de 30% aos automóveis importados. Segundo afirmou, não faria sentido permitir que outros países explorassem uma fatia de 30% do consumo do País.
Para ela, as avaliações de que os investimentos em sondas da Petrobras estariam atrasados por causa da elevada exigência de conteúdo nacional são "complexo de vira-lata". A demora, segundo informou, é causada pelos fornecedores internacionais, e não os brasileiros.
O governador do Espírito Santo, Renato Casagrande (PSB) confessou ter encontrado uma presidenta e um ministro da Fazenda "muito mais preocupados do que supunha que estivessem". Já o governador do Sergipe, Marcelo Déda (PT), acha que a presidente foi realista.
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