Vista de 2010 do terreno comprado pelo ministro; hoje há casa em construção no local
Ricardo Perrone
Em Campinas (SP)
Em agosto de 2010, Orlando Silva Júnior comprou, por R$ 370 mil, um terreno no distrito de Sousas, em Campinas (SP). Pela área de aproximadamente 90 mil m² passa um duto de gás da Petrobras.
Silva, que é ministro do Esporte desde 2006 e recebia à época da compra R$ 10.748, 43 mensais, pagou o terreno à vista. Conforme documento obtido pela reportagem, ele usou cheque administrativo –modalidade que permite o uso do cheque sem que o pagador movimente sua própria conta. Por meio de sua assessoria de imprensa, porém, ele deu outra versão. Afirmou ter pagado o terreno com um cheque pessoal.
Documentos da própria companhia mostram que há planos para mudanças nos dutos localizados no Estado de São Paulo, gerando alto risco de desapropriação. Um funcionário do condomínio Colinas de Atibaia, onde fica a propriedade, disse ao UOL Esporte que a equipe de uma empresa que trabalha para a petrolífera esteve lá recentemente. Avisou que os primeiros terrenos à esquerda da portaria passarão por uma desapropriação parcial. O objetivo é evitar riscos de contaminação.
O sítio do ministro é justamente o primeiro do lado esquerdo. Silva Júnior comprou um terreno que levou mais de um ano para ser vendido. Ele começou a construir uma casa perto do duto.
O PDD (Plano Diretor de Dutos), elaborado em 2007, mostra que uma das preocupações da Petrobras paulista é deixar os dutos que passam pelo Estado mais longe dos vizinhos para diminuir riscos de acidentes. O documento indica que a distância para os dutos deve aumentar, o que forçará mudanças.
"Com o objetivo de diminuir as interferências das populações nas faixas, o projeto PDD/SP irá adotar um novo conceito de corredor de dutos, que consiste na implantação de faixas de dutos com maiores larguras (aproximadamente 60 metros), proporcionando um maior distanciamento entre as comunidades e as faixas", diz trecho do relatório produzido pela Petrobras há quatro anos.
Aumentar a faixa obriga a companhia a pagar para ao proprietário da área para usar um trecho maior do terreno. É o que pode acontecer com um pedaço da propriedade do ministro. Essas desapropriações costumam ser feitas em negociações entre os proprietários e a empresa.
DE MÃOS DADAS
A Petrobras é uma forte parceira
do Ministério do Esporte. Em
agosto, colocou em prática o
projeto Esporte & Cidadania em
parceria com o ministério. Vai
investir R$ 30 milhões em esporte
educacional.
Haroldo Borges Rodrigues
Lima - Diretor-geral da Agência
Nacional de Petróleo, é membro
do PC do B e baiano, assim
como o ministro do Esporte.
Ana Cristina Petta - Atriz, a
mulher do ministro do Esporte, é
integrante da Companhia do
Latão, grupo teatral patrocinado
pela Petrobras.
Silva Júnior, porém, afirma desconhecer risco de desapropriações em sua área. Também diz não saber sobre as mudanças propostas pelo PDD.
De qualquer forma, quem, como Silva Júnior, tem trânsito na Petrobras, antiga parceira do Ministério do Esporte, pode conseguir um preço melhor na negociação com a empresa. O ministro se aproximou ainda mais da companhia por causa da questão dos dutos de Itaquera. Ele assinou como testemunha a carta de intenções entre Corinthians e Odebrecht para a construção do Itaquerão.
Além disso, Ana Cristina Petta, mulher dele, faz parte de uma companhia de teatro patrocinada pela Petrobras. Não é só. A Agência Nacional de Petróleo, que regula as atividades da área, é controlada pelo partido do ministro. Haroldo Borges Rodrigues Lima, diretor-geral da ANP, é baiano e integrante PC do B, como Silva Júnior.
OS DOCUMENTOS
O ministro e sua mulher compraram o terreno de um casal belga que foi representado por procurador
Esse valor foi pago a vista por Orlando Silva Júnior com um cheque administrativo, conforme mostra documento obtido pela reportagem do UOL Esporte
Assinatura do ministro no documento da compra
A empresa pagou ao casal belga que era dono do lote um preço bem melhor em relação ao acertado com Silva Jùnior, em um indício de que ter uma área transformada em servidão de passagem ou desapropriada pode ser um bom negócio até para quem não tem contatos na companhia. A petrolífera pagou R$ 5,96 pelo m², enquanto para o ministro cada m² custou cerca de R$ 4.
Em 2005, antigos donos receberam da Petrobras pela passagem do duto, como mostra escritura retificada e ratificada após venda para o ministro
O OUTRO LADO
Orlando Silva Júnior respondeu ao UOL Esporte sobre o terreno que comprou no distrito de Sousas, em Campinas. Ele afirma não haver risco na construção por causa do duto da Petrobras. Também alega desconhecer a possibilidade de desapropriações na área.
LEIA AS DECLARAÇÕES DO MINISTRO SOBRE O CASO
Por meio de sua assessoria de imprensa e via e-mail, Orlando Silva Júnior respondeu ao UOL Esporte sobre o terreno que comprou no distrito de Sousas, em Campinas. Ele afirma não haver risco na construção por causa do duto da Petrobras. Também alega desconhecer a possibilidade de desapropriações na área. Confira a entrevista:
UOL Esporte - Em 2010, o senhor comprou um terreno no distrito de Sousas, em Campinas. Sabia que um duto da Petrobras passa pela área?
Orlando Silva Júnior - Sim.
UOL Esporte - Não é arriscado construir uma casa num terreno por onde passa um duto de gás?
Não na área onde construo uma casa de 110 metros quadrados.
UOL Esporte - O senhor sabe que o Plano Diretor de Dutos prevê uma série de mudanças nos dutos e melhorias nas regiões em que eles estão? E que uma dessas medidas prevê um aumento nas faixas de servidão em terrenos como o seu?
Não.
UOL Esporte - Sabe da possibilidade de desapropriação parcial ou total de sua propriedade?
Não.
UOL Esporte - No mesmo condomínio, há outros terrenos que não são afetados pelos dutos. Não seria melhor ter optado por outro?
O terreno não fica em condomínio.
UOL Esporte - Como foi pago o terreno? À vista ou em prestações?
Foi pago com um cheque pessoal do Ministro.
UOL Esporte - Qual a sua relação com Haroldo Borges Lima, da ANP? São amigos?
Tenho relação partidária.
UOL Esporte - O senhor pagou um valor inferior ao pedido por donos de outros terrenos no mesmo condomínio. Sabe o motivo para o seu lote ser mais barato?
O terreno não faz parte de condomínio.
UOL Esporte - Quem indicou para o senhor esse terreno?
Eu mesmo procurei.
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