sábado, 1 de outubro de 2011

TCU aponta irregularidades em obra no Porto-Ilha do RN

Andrielle Mendes - repórter

O Tribunal de Contas da União (TCU) encontrou uma série de irregularidades na execução do projeto de ampliação do Terminal Salineiro de Areia Branca, a 330km de Natal. Entre as irregularidades, o Tribunal destaca deficiências no projeto básico, provável causa da assinatura de dois aditivos que aumentaram em 24,99% o valor do contrato, de R$174,8 milhões para R$ 218,5 milhões. O TCU também aponta um sobrepreço de R$ 21,6 milhões na obra, decorrente da contratação de serviços por preços maiores que os praticados pelo mercado. As obras, com conclusão prevista para o final de 2011, não foram suspensas.

rodrigo sena
O Porto-Ilha, também conhecido como Terminal Salineiro de Areia Branca, foi alvo de fiscalização entre os meses de maio e junho deste ano

A Companhia Docas do Rio Grande do Norte (Codern), responsável pelo Terminal, e o consórcio Areia Branca, que venceu a licitação para executar a obra de ampliação, têm 15 dias - a contar da notificação - para se pronunciar acerca das falhas no projeto básico e do sobrepreço constatado. O TCU analisará as respostas e decidirá os próximos passos. Codern e consórcio, segundo o Tribunal, podem provar a regularidade das ações. Se as justificativas não forem, porém, suficientes, o TCU poderá tomar medidas corretivas, que vão desde a redução do preço, considerado excessivo, até a paralisação da obra, "medida excepcional e tomada apenas diante de graves irregularidades". A Codern também pode ser multada, caso descumpra as determinações do TCU ou o prazo.

FISCALIZAÇÃO

A fiscalização foi realizada entre nove de maio e 17 de junho. Durante o período, a equipe de auditoria analisou a documentação referente à concorrência, contratos, execução das obras e serviços de assessoria à fiscalização, visitou os dois canteiros de obras - um em terra e outro em mar - e o Porto Ilha. Na época da fiscalização, o consórcio vencedor tinha concluído 55% das obras e esgotado quase o orçamento todo.

Entre vários pontos, a equipe constatou que o projeto básico, do qual resultou o contrato vigente, não apresentou os estudos necessários. "Em função da deficiência no projeto básico, foram pactuados dois aditivos, os quais somados totalizam R$ 43.700.258,45, o que representa 24,99% do valor contratado". Como na época da fiscalização o consórcio ainda precisava concluir 45% da obra, o TCU previu que o limite previsto para a obra, incluída no Pacote de Aceleração do Crescimento (PAC), seria extrapolado.

"Quando o projeto é muito simplificado e elaborado sem os estudos necessários, o risco de alteração no valor é muito maior. Entre os dez itens integrantes da planilha orçamentária, por exemplo, nove tiveram seus preços acrescidos por meio de aditivo ao contrato", diz o relatório do Tribunal. Além das falhas no projeto básico, o TCU também apontou sobrepreço na obra. Alguns serviços, não discriminados no projeto básico, teriam sido pagos num valor acima do praticado pelo mercado.

No projeto básico, apresentado pela Codern, serviços 'genéricos' somavam R$26,1 milhões, o que equivalia a 21% do valor licitado. No projeto executivo, entregue pelo consórcio vencedor, os serviços não discriminados somaram R$30,3 milhões, equivalente a 23% do valor contratado. Os serviços, segundo o TCU, foram estimados sem base em projetos ou memórias de cálculo que o justificassem.

Apesar de todas as falhas apontadas durante a auditoria, o TCU pondera que não se deve culpar quem não detém conhecimento técnico específico e competência funcional para elaborar um projeto como o analisado. "É preciso ainda averiguar a culpa de cada envolvido, para só então concluir se a irregularidade que lhe é atribuída poderia ou não ser por ele constatada e consequentemente evitada".

O TERMINAL

O Terminal Salineiro de Areia Branca começou a operar em 1975. De lá para cá, passou por apenas três grandes reformas - todas realizadas a partir de 2008. A nova reforma, alvo de suspeitas do TCU, amplia a capacidade do pátio de estocagem de sal de 100 mil toneladas para 150 mil toneladas e a velocidade das esteiras de 1,5 mil toneladas por hora para 2,5 mil toneladas, aumentando a movimentação de sal, que caiu nos últimos anos, passando de 2,5 milhões de toneladas para 1,7 milhões de toneladas por ano. A expectativa é movimentar mais de 3 milhões com a ampliação do Terminal nos próximos anos. O Rio Grande do Norte produz de 95 a 98% de todo o sal produzido no Brasil.

Codern espera notificação do TCU

"O projeto básico para ampliação e melhoramento do Terminal Salineiro de Areia Branca foi feito com muito critério", disse ontem o presidente da Companhia Docas do Rio Grande do Norte, Emerson Fernandes, ao saber das suspeitas do Tribunal de Contas da União (TCU). Segundo Emerson, a Codern ainda não tinha sido notificada e estava pronta para prestar todos os esclarecimentos necessários. "Não recebi a notificação oficial, o que deve ocorrer nos próximos dias, mas já sabia que a nossa obra ia gerar algumas dúvidas", disse. Isso porque, segundo Emerson, não há "em nenhum lugar do mundo" uma obra semelhante ao Porto Ilha.

A falta de parâmetros, segundo ele, explica, a diferença dos preços pagos pelos serviços. "Tenho certeza que todos os questionamentos feitos pelo Tribunal serão esclarecidos", disse, sem ter conhecimento do relatório, que detalhava todas as lacunas no projeto básico. Para Emerson, "não houve lacunas. Só no entender do TCU. Aliás, o projeto executivo não seria feito de qualquer maneira?".

Quanto ao fato de ter contratado, através de licitação, um consórcio que apresentou uma proposta maior que o orçamento previsto, Emerson justificou que em nenhum momento foi dito que o orçamento era o limite. "Pensei que servia de parâmetro e só", afirma. Ele também afirmou, ao contrário do que foi apontado, que nenhum valor foi incluído na planilha sem embasamento.

O consórcio Areia Branca, que conduz as obras no Porto Ilha, já está analisando o conteúdo do relatório. "O terminal salineiro é uma obra altamente complexa. Os aditivos foram reflexo dessa complexidade", justificou Edno Lima, diretor de Novos Negócios da Constremac Construções, empreiteira paulista, líder do consórcio, que também aguarda notificação. Edno tenta afastar as suspeitas do TCU. "O relatório não aponta nenhum indício de irregularidade. Mostra que há problemas no projeto básico e sobrepreço na contratação de serviços. É isso que vamos discutir junto ao TCU".

*Tribuna do Norte

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