Natal, reconhecida pelas suas belezas naturais, prova agora que também desenvolve pesquisas que contribuem para o avanço científico mundial. Uma renomada revista americana de ciência - Science Careers - publicou uma série de reportagens sobre a produção científica no Nordeste, na qual estão incluídos os projetos desenvolvidos pelo neurocientista Miguel Nicolelis e pela bioquímica Selma Jerônimo, no Rio Grande do Norte. Além do médico Mauro Copelli, que monitora pesquisas relacionadas à neurofisiologia na Universidade Federal de Pernambuco.
Frankie Marcone
Doutora Selma Jerônimo coordena grupo de 20 alunos do Departamento de Bioquímica da UFRN
A revista Science Careers é ligada à Associação Americana de Ciência com bastante destaque na comunidade científica mundial. Somente trabalhos com alto impacto na área e que mudam paradigmas são publicados pela Science. As descobertas científicas relacionadas ao cérebro, feitas por Miguel Nicolelis a partir do estudo com macacos, e a identificação de genes que influenciam a susceptibilidade da leishmaniose visceral, coordenadas pela professora do Departamento de Bioquímica da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), Selma Jerônimo, foram destaque na revista deste mês.
"A publicação das nossas pesquisas na Science Careers é uma demonstração de que na UFRN se faz ciência de qualidade. Além do nosso Departamento, muitos outros produzem excelentes estudos aqui na Universidade", destacou a professora. Além disso, ela ressaltou que a produção científica no Brasil é fruto de muita persistência por parte dos pesquisadores.
Os estudos coordenados pela potiguar são financiados por instituições de fomento à pesquisa nacionais e internacionais, dentre elas o Instituto Nacional de Saúde dos Estados Unidos. O processo de incentivo e a fomentação de pesquisas mais aprofundadas sobre determinados assuntos sofreu melhorias após a estabilização da moeda brasileira e o consequente controle da inflação. "Antes disso, quase não existia produção científica no país", afirmou Selma Jerônimo. Os próprios laboratórios utilizados pela equipe de Selma eram mal equipados e sem muitos recursos.
Apesar dos avanços e do destaque do Brasil no cenário científico mundial atualmente, alguns gargalos ainda impedem a expansão dos projetos de pesquisa. "Sempre existirão dificuldades e estas fazem parte de qualquer processo. A gente faz ciência porque o Brasil precisa. O Brasil não crescerá se não investir em educação", reiterou a cientista. Segundo Selma, as maiores dificuldades enfrentadas hoje pelos cientistas e suas equipes são relacionadas à estrutura disponível aos estudos. "Nos Estados Unidos, por exemplo, se você precisa de um reagente, pode recebê-lo no dia seguinte em seu laboratório. Aqui no Brasil, o processo pode demorar até seis meses". Para os pesquisadores citados na publicação, a burocracia nos processos de compra e importação de produtos e equipamentos ainda é uma grande barreira a ser vencida.
"O Brasil melhorou substancialmente em tudo. Mas ainda há gargalos muito grandes para a produção científica", frisou Selma Jerônimo. Para ela, a ciência deve existir para que o mundo seja transformado num lugar melhor e somente com a oferta de uma educação pública de qualidade, haverá a redução da desigualdade social no país.
Pesquisas são desenvolvidas na UFRN
As pesquisas da professora e doutora Selma Jerônimo sobre a leishmaniose, no Rio Grande do Norte, começaram há cerca de 20 anos. "A leishmaniose visceral foi pega como a doença modelo para nossas pesquisas. Além dela, estudamos também a hanseníase e a pré-eclampsia", explicou. O trabalho da cientista foi destaque devido aos avanços obtidos através de anos de estudo direcionados à identificação do diagnóstico precoce da doença que afeta milhares de pessoas e animais, principalmente no Norte do país. Antes resumida àquela região, a leishmaniose já atinge o Nordeste e se dissemina pelo Sul e Sudeste.
"Além disso, nós conseguimos compreender porque nem todos os infectados desenvolvem a doença ou os sintomas dela", afirmou Selma Jerônimo. A equipe de pesquisadores coordenados pela professora é formada por 20 alunos do Departamento de Bioquímica da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN).
A leishmaniose visceral, muito comum em Natal e nas cidades mais afastadas dos grandes centros urbanos é transmitida por um vetor popularmente conhecido como "mosquito pula-pula ou palha". De acordo com a cientista, a leishmaniose é um conjunto de doenças que tem como principais características a anemia grave e a infecção por bactérias, além da sonolência. A leishmaniose pode levar o infectado à morte, caso não tratada da forma correta. Pelo menos uma, entre dez pessoas doentes, morre. No Rio Grande do Norte, os casos identificados são tratados no Hospital Giselda Trigueiro, no Hospital Infantil Maria Alice Fernandes e no Hospital Regional de Mossoró.
Na região Oeste do estado, há a incidência da leishmaniose tegumentar, que lesiona a pele e pode ocorrer, também, nas mucosas. Os vetores que transmitem a doença se proliferam em solos úmidos e com resíduos orgânicos (fezes e urina de animais como galinha, gado e porcos, por exemplo). A moléstia é identificada no paciente através de um exame que permite a análise de determinados anticorpos presentes no sangue e que podem permanecer na corrente sanguínea até um ano após a infecção.
A leishmaniose incide também nos animais domésticos. Num recente estudo realizado na zona Norte da capital, cerca de 20% dos cães foram diagnosticados como portadores da doença. A maioria dos infectados, porém, é assintomática. De acordo com a professora, a população deve se prevenir. "Todos nós devemos ser mais responsáveis para podermos contribuir para a resolução dos problemas. Podemos melhorar nossa qualidade de vida mantendo os ambientes nos quais vivemos sempre limpos, sem lixo, sem umidade no solo aliada à decomposição orgânica", ressaltou Selma Jerônimo.
*Tribuna do Norte
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