São Paulo (AE) - A presidenta Dilma Rousseff demitiu ontem o ministro da Defesa, Nelson Jobim, terceiro integrante do primeiro escalão a cair em sete meses de governo. O Palácio do Planalto confirmou à noite que Jobim entregou o pedido de demissão e será substituído por Celso Amorim, que foi ministro de Relações Exteriores no governo Lula. O motivo da demissão foram as críticas de Jobim às ministras Gleisi Hoffmann (Casa Civil) e Ideli Salvatti (Relações Institucionais), publicadas na revista Piauí, que circulou ontem. "Ou você pede para sair ou saio com você", disse Dilma a Jobim, ontem, por telefone.
Nelson Jobim nega teor das declarações publicadas pela Piauí
Nelson Jobim amanheceu ontem ainda ministro em Tabatinga (AM), na fronteira com a Colômbia, na companhia dos ministros José Eduardo Cardozo (Justiça) e Moreira Franco (Assuntos Estratégicos) e do vice-presidente, Michel Temer. Todos participavam de missão oficial para lançar o plano de segurança nas fronteiras e se reuniram com o vice-presidente da Colômbia, Angelino Garzón. Por causa da crise, Jobim antecipou a volta a Brasília.
Nas últimas semanas, gestos e declarações de Jobim azedavam a relação com o governo, sobretudo por ter admitido publicamente que votou em José Serra (PSDB) em 2010 e ter feito críticas à condução política da administração de Dilma.
Jobim era mais um ministro herdado da administração do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Os outros dois que saíram foram Antonio Palocci (Casa Civil) e Alfredo Nascimento (Transportes).
Intrigas
No Amazonas, Jobim e a comitiva, especialmente Temer, minimizavam o impacto das declarações do ministro. À revista, que preparou um perfil de Jobim, ele disse que Ideli é uma ministra "fraquinha" e acusou Gleisi de não conhecer Brasília. Abordado por jornalistas, Jobim negou ter feito tais afirmações. Disse que tudo fazia parte "de um jogo de intrigas". "Em momento algum eu fiz referência dessa natureza (a Ideli). Aliás, o que eu realmente reconheço na Ideli é a capacidade, uma tenacidade importantíssima na condução dos assuntos do Congresso."
No perfil que a revista Piauí fez de Jobim é narrada a reação do peemedebista depois de um encontro com o senador Fernando Collor (PTB-AL), que havia sido procurado no processo de negociação da liberação dos papéis secretos do governo. Collor quer que alguns tenham sigilo eterno. Após sair do gabinete de Collor, e enquanto comia uma salada, Jobim afirmou, na presença da repórter: "É muita trapalhada, a Ideli é muito fraquinha e Gleisi nem sequer conhece Brasília".
Em nota publicada na página do Ministério da Defesa na internet, Jobim disse que suas informações foram tiradas do contexto. Afirmou que tem auxiliado Ideli nas articulações no Senado para a aprovação do projeto da Lei de Acesso à informação. Fez, de novo, elogios à "capacidade" da ministra. "Isso faz parte daquilo que passa pela cabeça de quem não conhece a necessidade de um país."
Celso Amorim será nomeado para o Ministério da Defesa
Os argumentos de Jobim, porém, não sensibilizaram a presidenta Dilma Rousseff. Durante almoço com os ministros Gilberto Carvalho (Secretaria-Geral), Gleisi, Ideli e Helena Chagas (Comunicação), Dilma disse que tinha tomado a decisão de demiti-lo. Preferia, no entanto, que ele pedisse demissão. Por isso, aguardaria sua volta de Tabatinga.
Dilma estava muito irritada com o fato de Jobim ter se encontrado com ela na quarta-feira, em audiência, e não ter falado nada sobre suas opiniões a respeito das ministras - ambas da cota pessoal de Dilma. No mesmo encontro, Jobim deu algumas explicações sobre declarações que soaram mal no governo e saiu dizendo que era ministro "por prazer". Na noite da quarta-feira, logo depois de saber que trechos da revista seriam publicados no dia seguinte, Jobim ligou para Ideli e falou da reportagem, feita há cerca de um mês. Insistiu que as palavras dele estavam "fora de contexto". Ideli fez o relato da conversa a Dilma.
O vice-presidente tentou, mais cedo, minimizar o impacto das declarações de Jobim: "A ministra Ideli e a ministra Gleisi têm o apreço, o apoio, e palavras de elogio (de Jobim)". Antes de Jobim embarcar às pressas a Brasília, o script parecia normal. O então ministro assinou o Plano Binacional de Segurança Fronteiriça (Brasil-Colômbia), em Tabatinga. Porém, horas depois, o clima de tensão ficou evidente. Jobim falou ao celular, por uns cinco minutos, isolado. Depois, aproximou-se de Temer, com quem trocou algumas palavras.
Petistas reclamam de sucessivos constrangimentos
Rio de Janeiro (AE) - Reunidos ontem no Rio, integrantes da executiva nacional e parlamentares do PT foram unânimes na avaliação de que Nelson Jobim fez o que pôde para criar constrangimentos à presidenta Dilma Rousseff e não tinha mais condições de continuar à frente do Ministério da Defesa. Alguns mal disfarçaram a torcida pela queda imediata de Jobim. Para os petistas, o ministro foi "indelicado" com Dilma. Eles diziam, no entanto, não entender a tática de criar sucessivas situações embaraçosas em tão pouco espaço de tempo.
"O ministro Jobim vai mostrando falta de identidade com o governo. Ele dá sinais de cansaço, de querer sair do governo. Com declarações cada vez mais polêmicas, ele dificulta a convivência com os ministros e com a própria presidente", disse o líder petista na Câmara, Paulo Teixeira (SP). O deputado destacou que Jobim, ao revelar que votou no tucano José Serra para presidente, criou tensão em seu próprio partido, o PMDB do vice-presidente Michel Temer. "O ministro Jobim indicou que não votou no próprio vice-presidente Michel Temer. O PMDB não tem dado sinais de que concorda com as declarações de Jobim", disse o líder.
Novo ministro colecionou polêmicas
Brasília (AE) - Patrocinador de uma política externa ideológica com foco em países periféricos, petista de carteirinha por inspiração do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, Celso Amorim colecionou polêmicas à frente das Relações Exteriores. No caso mais notório, meteu-se na questão nuclear do Irã, atraindo a censura dos países centrais. Ministro das Relações Exteriores dos governos de Itamar Franco (1992/94) e Luiz Inácio Lula da Silva (2003/10), o embaixador foi responsável pelo direcionamento da política externa brasileira para o Oriente Médio, a América do Sul, a África e nações emergentes que, com o Brasil, formam o Brics - África do Sul, China, Índia e Rússia.
Também estreitou laços diplomáticos com Cuba, Síria, Líbia e Irã Amorim liderou ainda o boicote dos países da Organização dos Estados Americanos (OEA) ao governo de Roberto Michelletti, que assumiu a presidência de Honduras em junho de 2009, depois de um golpe militar que derrubou o presidente eleito Manuel Zelaya. Como resultado das negociações de Amorim, a OEA excluiu Honduras do grupo de países americanos.
Ao mesmo tempo, Amorim liderou um movimento de ajuda a países pobres em sua luta contra a fome. Foi também importante articulador na formulação de grupos como o G-20, na frente multilateral contra o protecionismo comercial dos Estados Unidos e da Europa e na tentativa de reformular a Organização das Nações Unidas (ONU). Lutou, sem êxito, para tornar o Brasil membro do Conselho de Segurança da ONU.
Durante a gestão de Celso Amorim, o Brasil enfrentou algumas crises com seus vizinhos, como a Bolívia e o Equador. Em 2006, o presidente boliviano Evo Morales anunciou a nacionalização do gás e do petróleo em seu território. O exército do vizinho ocupou as empresas estrangeiras, entre elas a Petrobras, que explorava os dois principais campos de gás. Amorim chegou a dizer que a nacionalização já era esperada, o que foi criticado no Brasil.
Em 2008, durante o agravamento da crise entre o Equador e a Colômbia, por conta do ataque colombiano a um grupo das Farc em território do vizinho, Amorim ajudou na resolução do conflito.
Declaração foi deselegante, diz Lula
Bogotá (AE) - O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva considerou "deselegante" a atitude do ministro da Defesa, Nelson Jobim, de criticar colegas de ministério. "Se o Jobim fez aquilo, não é correto", disse. "Não é correto fazer críticas sobre outros ministros, não é elegante."
Questionado se isso seria caso de demissão, ele disse não saber e acrescentou que a presidenta Dilma Rousseff deverá conversar com o ministro Jobim. "Dois gaúchos se entendem. Ou não se entendem."
Ele contou que foi informado que, na noite de quarta-feira, Dilma e Jobim tiveram uma conversa da qual saíram satisfeitos. "Se ele não falou para ela da Piauí e ela ficou sabendo, realmente cria uma situação constrangedora para ele, que não falou, e para ela. Foi muito deselegante."
O ex-presidente elogiou a atuação de Jobim e afirmou que ele vem conduzindo o Ministério da Defesa "com muita grandeza" e fazendo um trabalho "excepcional". "Mas até o Pelé, se estiver jogando mal, o técnico tira, pô."
Para Lula, é um "erro histórico" achar que Jobim é indicação sua "A presidenta Dilma se reunia com meus ministros muito mais do que eu", observou. Cada proposta que chegava à sua apreciação, explicou, era discutida antes em dez reuniões com Dilma, então ministra da Casa Civil. "Os ministros eram mais amigos dela do que meus amigos."
Da mesma forma, ele afirmou não sentir "nenhum constrangimento" pelo fato de denúncias de corrupção estarem provocando a demissão integrantes de sua antiga equipe de governo. "Eu ficaria constrangido se não estivessem apurando", afirmou. "O importante é que não fique impune."
Marido da ministra-chefe da Casa Civil, Gleisi Hoffman, que para Jobim não conhece Brasília, o ministro das Comunicações, Paulo Bernardo, foi econômico ao comentar a demissão. "Eu não vou cometer o erro do Jobim e falar de outros ministros", disse. "Talvez como um gaúcho empedernido do interior ele tenha arraigada a insatisfação de ser comandado por mulheres", acrescentou.
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