O ministro Luiz Fux, do Supremo Tribunal Federal (STF), deu ontem um voto favorável à declaração de constitucionalidade da lei da Ficha Limpa, que impede a candidatura a mandato eletivo de políticos condenados por órgão colegiado ou que renunciaram para evitar processo de cassação. O julgamento foi adiado por pedido de vista do ministro Joaquim Barbosa.
Nelson Jr.
Ministros do Supremo Tribunal Federal preferiram esperar a posse de Rosa Maria Weber
Luiz Fux, relator da ação que pede a declaração de constitucionalidade da Ficha Limpa, afirmou que os políticos só podem ser atingidos pela lei se a renúncia foi para fugir de processo já abertos. Quando a renúncia ocorre antes da instauração formal, de acordo com o ministro, o político não pode ser considerado inelegível.
Apesar desse aspecto do voto, Fux defendeu a constitucionalidade do ponto central da Ficha Limpa: a inelegibilidade de políticos condenados em segunda instância ou por órgãos colegiados por crimes contra o patrimônio público, por exemplo. Mas reduz o prazo previsto na legislação.
De acordo com a lei, o político fica inelegível desde a condenação até oito anos depois do fim do cumprimento da pena. Na prática, esse prazo poderia se estender por décadas. Isso porque, até que o Judiciário julgue todos os recursos contra essa condenação em segunda instância, anos podem se passar. Fux afirmou em seu voto que o prazo de oito anos deve começar a contar do dia em que o político foi condenado em segunda instância.
Para evitar o empate, que os ministros sabiam que ocorreria, foi combinado que alguém pediria vista. A missão coube ao ministro Joaquim Barbosa. Isso livrará a nova ministra, Rosa Maria Weber Candiota da Rosa, indicada nesta semana pela presidente Dilma Rousseff, de ser a última a votar e, no final das contas, ser responsabilizada por eventualmente derrubar os pontos centrais da Ficha Limpa.
Até horas antes da sessão de ontem, ministros ainda discutiam a possibilidade de adiar o julgamento para esperar a posse da nova ministra. No entanto, Fux insistia em dar seu voto.
Após o pedido de vista, as ações só voltarão a ser julgadas depois da posse da nova ministra, que ainda será sabatinada pela Comissão de Constituição e Justiça e passará pela aprovação no plenário do Senado.
Voto
"A presunção de inocência deve ser relativizada para fins eleitorais", afirmou Fux, ao votar a favor de ações que pedem a declaração da constitucionalidade da Lei da Ficha Limpa. O princípio da presunção de inocência estabelece que ninguém será considerado culpado até uma decisão judicial definitiva e sem chances de recurso.
Fux disse que é notório o desejo da população brasileira pela moralização do exercício dos mandatos eletivos no País. A lei é resultado de uma iniciativa popular que obteve o apoio de mais de um milhão de eleitores. De acordo com o ministro, "o salutar amadurecimento" recomenda que o STF reveja sua jurisprudência sobre o princípio da presunção de inocência no âmbito eleitoral. Para ele, políticos podem ser considerados inelegíveis por fatos ocorridos antes da lei.
Pelo voto do relator, a partir de 2012 a norma pode impedir a candidatura de políticos, o que não foi possível em 2010 porque a lei não foi aprovada com um ano de antecedência. Em março, o STF concluiu que a regra não valeu no ano passado, o que liberou a candidatura de barrados por condenações e renúncias
OAB apresenta argumentos favoráveis à constitucionalidade
O presidente nacional da OAB, Ophir Cavalcanti, defendeu, no plenário do Supremo Tribunal Federal, a declaração de constitucionalidade da lei da Ficha Limpa. Ele disse que o julgamento é um divisor de águas entre o que existe hoje, no campo político, e o que a sociedade - de cuja iniciativa nasceu a lei, com a coleta de mais de um milhão de assinaturas de apoio - deseja.
"Ainda vivemos uma liberdade conquistada, mas que ainda precisa de conteúdo social, moral e ético", afirmou. Isso porque, segundo ele, "ainda há um grande atraso nas práticas políticas - caciquismo, clientelismo, falta de decoro -, práticas que precisam acabar".
O advogado-geral da União, Luís Inácio Adams, corroborou os argumentos do presidente da OAB e do advogado do PPS, observando que "a representação parlamentar é essencial para a qualidade da nossa democracia". E, como disse, o aperfeiçoamento desta passa pela necessidade de garantir, na representação política, a legitimidade dos representantes da sociedade nos legislativos do país.
Também ele defendeu a retroatividade da lei, observando que o parágrafo 9º do artigo 14 da Constituição Federal é claro ao estabelecer a probidade administrativa e a moralidade como requisitos para o exercício de mandato.
Ao se manifestar na sessão de ontem, o procurador-geral da República, Roberto Monteiro Gurgel, também disse que deve ser declarada a constitucionalidade da LC 135/2010.
Ministro do Supremo faz duas ressalvas
O ministro Luiz Fux, relator do processo que analisa a constitucionalidade da Ficha Limpa no Supremo Tribunal Federal, fez duas ressalvas em relação à lei. Para ele, a alínea "e" do parágrafo 7º do artigo 1º deve ser alvo do que se chama de interpretação conforme o Supremo. Ou seja, não será julgada inconstitucional, mas será modificada a partir da leitura dos ministros sobre a regra. De acordo com a alínea, ficam inelegíveis "os que forem condenados, em decisão transitada em julgado ou proferida por órgão judicial colegiado, desde a condenação até o transcurso do prazo de oito anos após o cumprimento da pena". O ministro propôs que o período entre a decisão que o tornou inelegível e o trânsito em julgado da decisão seja subtraído do prazo de inelegibilidade previsto na lei.
A segunda ressalva do ministro Luiz Fux diz respeito aos políticos que renunciam aos cargos para escapar de responder a processo de cassação. Pela lei, a renúncia para escapar do processo torna o político inelegível por oito anos. Na visão de Fux, só podem ser impedidos de concorrer os que renunciarem depois de aberto processo que pode culminar com a cassação do mandato. Por essa interpretação, Jader Barbalho, por exemplo, não teria sido declarado inelegível.
Julgamento depende da posse no STF
O julgamento de ontem no Supremo Tribunal Federal foi adiado por pedido de vista do ministro Joaquim Barbosa. O ministro justificou que o fez para evitar novo impasse e que só trará o processo para julgamento depois da posse da nova ministra, Rosa Maria Weber. O presidente do STF, Cezar Peluso, declarou na quarta-feira considerar a possibilidade da posse da nova ministra ficar para o próximo ano, uma vez ela ainda precisará passar por uma sabatina no Senado. Além disso, afirmou Peluso, a preparação da cerimônia pode levar mais tempo que os dias restantes até o recesso do Supremo, que começa em meados de dezembro. Assim, a conclusão do julgamento da Ficha Limpa ficaria para 2012.
Questionado sobre a possibilidade de a posse da nova ministra demorar demais, e só fique para o ano que vem, Joaquim Barbosa foi claro: "Se demorar, não será problema meu. Não escolho ministro, não nomeio e nem sabatino."
A discussão sobre a lei começou na segunda parte da sessão plenária desta quarta-feira. Na primeira, os ministros analisaram o recurso de Jader Barbalho. O político pede ao tribunal que se retrate, já que o STF barrou sua candidatura com base na Lei da Ficha Limpa e, depois, decidiu que ela não poderia ser aplicada nas eleições de 2010. Diante de um novo impasse, a decisão foi também adiada.
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