domingo, 23 de fevereiro de 2020

Ceará: Governo afasta 168 e pune outros 77 desertores da Polícia Militar

Nomes divulgados no Diário Oficial do Estado deverão ficar por até 120 dias em investigação. Todos eles ficam automaticamente com os salários suspensos. Os profissionais deverão devolver os equipamentos de trabalho

Da redação com Diário do Nordeste
Por Wagner Mendes
Em resposta aos motins organizados por uma parcela de policiais militares nos últimos dias, a Controladoria Geral de Disciplina (CGD) instaurou processo investigativo contra 161 policiais militares por “condutas transgressivas”. A ação governista impacta no afastamento imediato desses profissionais e na suspensão dos salários. Além dos 161 militares, outros sete já haviam sido identificados devido a publicações nas redes sociais feitas antes das paralisações, o que totaliza 168 policiais afastados.

Neste sábado (22), a Polícia Militar decidiu também suspender o salário de outros 77 policiais. Eles foram considerados “desertores” por faltarem à convocação para trabalhar no interior durante o Carnaval. Os profissionais de Segurança deveriam ter se apresentado às 9h do sábado para atuar em cidades como Aracati, Camocim, Redenção e Cascavel. 

Nas informações, publicadas na edição do Diário Oficial do Estado de sexta-feira (21), em relação às investigações, consta que os policiais deverão se afastar por 120 dias, que é o prazo da apuração dos casos. Eles ainda deverão devolver a “identificação funcional, distintivo, arma, algema e qualquer outro instrumento de caráter funcional que esteja em posse do servidor”.

Ao justificar a abertura do procedimento de investigação, a Secretaria de Segurança Pública e Defesa Social (SSPDS) alegou que a prática de “ato incompreensível com a função pública” acabou “gerando clamor público” e “tornando os afastamentos necessários à garantia da ordem pública” no Estado. 

De acordo com a Pasta, a Polícia Militar do Ceará também abriu inquéritos policiais militares (IPMs), remetidos à CGD. Outros procedimentos seguem em andamento tanto pela Polícia Militar do Ceará quanto pela própria CGD.

Em meio à crise na Segurança Pública do Estado, o ministro da Justiça e Segurança Pública, Sérgio Moro, desembarca amanhã em Fortaleza ao lado dos comandantes da Defesa, Fernando Azevedo e Silva, e da Advocacia Geral da União, André Luiz Mendonça, para acompanhar a Operação de Garantia da Lei e da Ordem (GLO) em curso no Estado por determinação do presidente Jair Bolsonaro.

Críticas

Presente no Estado nos últimos dias para tentar uma negociação entre amotinados e o Governo, o senador Major Olímpio (PSL-SP) divulgou um vídeo ontem nas redes sociais criticando a paralisação no Ceará e pedindo o fim dos motins nas unidades policiais. 

“Tentei junto com os parlamentares, em conversas com o Governo, no batalhão de amotinados, dissuadi-los (sic) a voltarem para as suas casas e retomarem as suas vidas sem parar, logicamente, a luta pela dignidade da família policial, mas não posso concordar com movimentos como eu vi: policiais encapuzados feito bandidos black blocs, viaturas arriadas e depredadas, viaturas de corporações policiais e bombeiros sendo arrebatadas nas ruas por pseudopoliciais mascarados, armados”, declarou o senador.

Olímpio, que esteve ao lado de senadores cearenses, como Tasso Jereissati (PSDB), Eduardo Girão (Podemos) e Prisco Bezerra (PDT), na tentativa de abrir um canal de diálogo, disse ainda que “a sociedade não pode ser penalizada” e que “tocar fogo em veículo particular e transporte público é coisa de terrorista, de criminoso”. “Quero dizer aos policias: não se deixem levar por falsas lideranças, algumas que têm mandato parlamentar e estão escudadas e têm salário garantido”. 

O senador argumentou ainda que “não haverá nova anistia para esses casos no Congresso Nacional”. O senador se refere a pelo menos dois projetos de lei que estão em tramitação no Congresso Nacional, um na Câmara e outro no Senado, que podem perdoar policiais, bombeiros e agentes penitenciários que participaram de paralisações. Os atos de 2020, no entanto, de acordo com Olímpio, não entrariam no texto da lei.

Em articulação com associações militares, o Governo Federal tenta, com projeto de lei, criar novos padrões de conduta e unificar a estrutura das polícias militares no País — uma demanda antiga das categorias. As normas de 1983 definem a hierarquia das corporações, estabelecem a conduta das atribuições ostensiva e preventiva dos agentes e o código de ética. A grande “inconsistência” no texto criticada por entidades representativas, e que acabou criando uma pauta na agenda do Governo, é que o decreto é sobreposto por regras estaduais. O resultado é que não há uniformidade na estrutura das polícias do País.

Punições 

Na paralisação de 2012, nomes considerados atualmente como lideranças políticas foram alvo, na época, de procedimentos administrativos. 

Cabo Sabino, por exemplo, é ex-presidente da Associação das Praças do Estado do Ceará. Em 2013, ele e outros nove dirigentes de associações foram expulsos da PM, como reflexo da greve de 2012. No ano seguinte, foi eleito deputado federal. Eles foram reintegrados em 2015, após conseguirem perdão.

Soldado Noelio é ex-vice-presidente da Associação dos Profissionais da Segurança. Ele foi um dos policiais demitidos em 2013, por conta da greve de 2012, e também foi reintegrado em 2015. 

Logo depois do episódio, chegou a assumir vaga na Câmara Municipal de Fortaleza como suplente. Em 2018 foi eleito deputado estadual. Depois de ter sido eleito deputado estadual, Noelio foi desligado da corporação sem direito a nenhum tipo de benefício, porque quando assumiu cargo eletivo ele tinha menos de dez anos de serviço na Polícia.

Capitão Wagner defende que partes voltem a negociar

Um dos representantes dos militares nas negociações com o Governo do Estado, o deputado federal Capitão Wagner (Pros) defende uma nova reunião entre interlocutores do Governo e os integrantes do movimento sobre a proposta de reajuste salarial dos policiais e bombeiros militares. Após o início das manifestações, Capitão Wagner voltou das atividades em Brasília.

Na última quinta-feira (20), ele trouxe dois deputados federais de fora do Ceará para tentar abrir um canal de diálogo. O parlamentar também acompanhou algumas reuniões de uma comitiva especial formada por senadores – entre eles os três cearenses – que ficou no Estado até a última sexta (21).

No primeiro momento, o grupo de parlamentares se reuniu com o governador Camilo Santana (PT) e, depois, acompanhado de Capitão Wagner, foi até o 18º Batalhão da PM, no bairro Antônio Bezerra, para ouvir a categoria.

Wagner frisa que seus contatos com os integrantes do movimento têm sido no sentido de “conter” os ânimos e “pedir calma”. Reportagem publicada no Diário do Nordeste deste sábado (22) mostrou policiais amotinados no quartel em Sobral falando sobre a influência de Capitão Wagner e outras lideranças do seu grupo político nos atos realizados no município da região Norte.

Segundo manifestantes, que pediram anonimato, orientações seriam repassadas por telefone. Wagner diz que não “incentiva” ninguém a participar do movimento e que o seu “esforço” tem sido procurar interlocução entre o Governo do Estado e os manifestantes.

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