quarta-feira, 27 de novembro de 2019

Tribunal julga nesta quarta caso que pode ser decisivo para volta de Lula à prisão

Apelação na ação do sítio de Atibaia será analisada no TRF-4, que cogita anular sentença de juíza.

Da redação com Folha de São Paulo
Por Felipe Bächtold

SÃO PAULO - Quase dois anos após o julgamento que levou o ex-presidente Lula à prisão, os juízes do TRF-4 (Tribunal Regional Federal da 4ª Região) voltam a se reunir na manhã desta quarta-feira (27) para decidir um caso que pode ser determinante para que o petista vá novamente para o regime fechado.

Os magistrados vão julgar recurso de Lula contra condenação em primeira instância por corrupção e lavagem no caso do sítio de Atibaia (SP), que era frequentado pelo petista e que foi reformado pelas empreiteiras Odebrecht e OAS.

Fora da cadeia desde o último dia 8, Lula já atingiu a marca de um sexto da pena cumprida na condenação no caso do tríplex de Guarujá (SP), que garante que ele não voltará para o regime fechado por causa desse primeiro processo, ainda pendente de recursos nas instâncias superiores.
Dessa forma, o caso do sítio pode ser decisivo para o futuro da liberdade do petista, já que há uma articulação no Congresso para a volta da possibilidade de prisão de condenados em segunda instância.

Entre nove ações penais abertas contra ele no Paraná, São Paulo e DF, o caso do sítio é o que está em estágio mais avançado após o processo do tríplex, que já teve condenação confirmada também no âmbito do STJ (Superior Tribunal de Justiça).

Em fevereiro, a juíza Gabriela Hardt, que substituiu Sergio Moro na Vara Federal de Curitiba, condenou o ex-presidente a 12 anos e 11 meses de prisão por ter aceitado as benfeitorias na propriedade rural em troca de favorecimento às empreiteiras em contratos na Petrobras. Outros nove acusados também foram condenados.

As defesas e o Ministério Público Federal recorreram ao TRF-4, corte com sede em Porto Alegre que funciona como segunda instância da Justiça Federal. No julgamento desta quarta, representantes das partes vão se pronunciar, e três juízes vão ler seus votos na parte final, antes de o resultado ser proclamado.

Dependendo do placar, aumentam as chances de recurso das defesas na própria corte regional. Em caso de uma condenação por 2 a 1, por exemplo, os advogados podem apresentar nova apelação à Quarta Seção do TRF-4, composta por mais magistrados.

O julgamento pode se estender por todo o dia. No caso do tríplex de Guarujá, no qual Lula teve condenação confirmada no TRF-4 no início de 2018, a sessão durou mais de nove horas.

O trio de magistrados que atua na Lava Jato tem uma modificação em relação ao grupo que condenou Lula em 2018: saiu Victor Laus, que votou pela condenação de Lula à época e que agora é presidente do tribunal, e entrou Carlos Thompson Flores, que comandava a corte até junho. 
Em mais de cinco anos de Lava Jato, o TRF-4 tem um histórico de alinhamento com as decisões de Curitiba. Desta vez, porém, é possível que a corte anule neste julgamento a sentença de Gabriela Hardt, sem julgar o mérito dos recursos das defesas, devido a uma recente decisão do STF (Supremo Tribunal Federal) sobre a ordem de fala de delatores e delatados em processos na primeira instância.

Antes de apresentar suas considerações finais na ação penal, no fim do ano passado, a defesa de Lula pediu para se manifestar apenas após réus delatores, que haviam feito acusações contra o petista.

A juíza negou à época essa solicitação, mas em outubro deste ano o Supremo reconheceu que esse benefício é necessário para assegurar a ampla defesa a réus que não fecharam acordo de colaboração. Duas sentenças da Lava Jato que não envolvem Lula já foram anuladas pelo STF por causa disso.

Diante desse novo entendimento da suprema corte, os juízes do TRF-4 podem considerar que o caso precisa voltar à primeira instância para que a etapa de alegações finais seja refeita, agora respeitando essa distinção entre delatores e delatados. 

Isso significaria que o processo do sítio retrocederia em 11 meses —as alegações finais dos réus foram entregues em janeiro deste ano. 

O Ministério Público Federal que atua na segunda instância, responsável pela acusação, chegou a concordar com a volta para essa etapa, mas depois recuou.

Diferentemente do julgamento de 2018, a apelação no caso do sítio ocorre em momento em que a Lava Jato está sob forte pressão. Os investigadores sofreram derrotas no Judiciário ao longo deste ano e enfrentaram críticas de ministros do Supremo após a revelação de mensagens trocadas no aplicativo Telegram.

Os advogados do ex-presidente inclusive incluíram em seus memoriais apresentados à corte regional trechos de diálogos divulgados pelo site The Intercept Brasil e por outros veículos, como a Folha. A defesa queria ainda a inclusão entre as provas de mensagens obtidas na investigação sobre o hackeamento de celulares de autoridades na Operação Spoofing. 

A defesa de Lula no caso se concentra em questionamentos sobre imparcialidade. Afirma que nem os juízes Moro e Hardt nem os procuradores da Lava Jato tinham o distanciamento necessário para atuar no caso e que a Vara Federal de Curitiba não era o foro correto para o processo.

Entre outros pontos que devem ser analisados pelo TRF-4, estão o suposto "aproveitamento" por Hardt da sentença proferida por Moro no caso tríplex e a falta de vínculo do caso com a Petrobras.

A defesa cita ainda pendência de manifestação final do Comitê de Direitos Humanos da ONU a respeito de reclamação apresentada pelo petista.

Sobre as reformas feitas no sítio, a defesa afirma que o ex-presidente jamais pediu ou recebeu vantagens indevidas nem concedeu benefícios específicos para as construtoras. "A 'gratidão' dos empresários para com Lula decorre de ações lícitas realizadas pelo ex-presidente, que conduziram ao crescimento de tais empresas em razão de políticas governamentais bem-sucedidas", diz a defesa.

Para o Ministério Público, os advogados do ex-presidente elegeram "a teoria conspiratória como o principal fundamento para a demonstração da inocência de seu cliente".
OS JUÍZES QUE VÃO ANALISAR O CASO DO SÍTIO DE ATIBAIA (SP)

João Pedro Gebran Neto, 55,
É relator da Lava Jato no Tribunal Regional Federal desde o início da operação, em 2014. Ele está na corte desde 2013 e votou pela condenação de Lula no caso do tríplex de Guarujá (SP), em 2018

Leandro Paulsen, 49,
É o revisor da Lava Jato na turma que julga recursos da operação na corte com sede em Porto Alegre. Ele também votou pelo aumento da pena de Lula no caso tríplex. É juiz do tribunal desde 2013

Carlos Eduardo Thompson Flores Lenz, 56
É o presidente da turma. Ele é o mais novo integrante do grupo que julga a Lava Jato, já que até junho estava na presidência do tribunal e não participava dos julgamentos. Em 2017, disse em entrevista que a sentença contra Lula no caso tríplex teve um 'exame irrepreensível' de provas e foi criticado pelo ex-presidente

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