O empresário Abelírio Rocha não ficou por longos período em cada um dos cargos públicos que ocupou. Mas acumulou experiência ao comandar a Secretaria Nacional de Irrigação e as Secretarias Estaduais de Agricultura e, depois, de Planejamento. Além disso, presidiu a Federação das Indústria do Rio Grande do Norte (Fiern). Coube a Bira Rocha, como é conhecido, conduzir uma ampla reforma administrativa no Estado, em 1995, no início do primeiro governo Garibaldi Filho. Na época, havia desequilíbrio financeiro e risco de colapso, diante do déficit nas contas públicas.
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Foram apenas cinco meses no cargo de secretário de Planejamento. Mas um período suficiente para executar um ajuste que extinguiu empresas, mudou regimes tributários, cortou 40% dos cargos comissionados e definiu mecanismos rígidos de controle das despesas. A meta era chegar ao fim do primeiro semestre com o equilíbrio das contas. Um mês antes, o objetivo foi atingido.
Agora, com o Estado em uma situação ainda mais grave, ele considera que não há alternativa que não seja o novo governo, também nos primeiros meses, adotar medidas duras para diminuir despesas e aumentar receitas. Bira Rocha defende a privatização da Caern, mas reconhece que a venda da companhia a investidores privados não seria suficiente para o Estado voltar a pagar em dia os servidores e investir. “O Estado está com um buraco tão grande, que só a Caern privatizada não consegue tapar”, comentou.
Com relação à chegada de Jair Bolsonaro à Presidência, Bira Rocha afirma que o plano de levar o economista Paulo Guedes para conduzir a retomada do crescimento e Sérgio Moro para o combate à insegurança foram escolhas acertadas para o momento.
Quais as perspectivas para o novo governo federal a partir em 2019?
A eleição de Jair Bolsonaro foi como uma marreta que derrubou o bunker da velha política. Algo semelhante à queda do Muro de Berlim. O que vai ser construído em cima destes destroços? Não sabermos, porque está cedo. Ele sinaliza que vai tomar algumas medidas. Sabe que se elegeu em linha direta com o povo. Chamou grandes economistas, como Paulo Guedes, e deu autonomia. Isso pode significar crescimento econômico, o que trará emprego para o país, hoje com 14 milhões de desempregados. Além disso, decidiu colocar Sérgio Moro em um Ministério que será estratégico, uma vez que terá a atribuição de combater a corrupção e a violência. Então, montou o governo com base nestas duas escolhas. Se isso funcionar bem, ele estará sendo coerente com o que disse na campanha. Isso dará, a partir dos entulhos do “muro” derrubado, uma nova perspectiva para o Brasil. A dúvida é sobre a resistência no Congresso Nacional e — por que não dizer? — também no Judiciário e em outras áreas, que podem continuar como antigamente.
Pode haver barreiras para implementar as medidas que são considera necessárias à retomada do crescimento?
Isso. Mas vamos saber daqui a cinco ou seis meses. Se ele conseguir enfrentar o Congresso... Parece que houve alguma renovação no Congresso, mas não sei se as mentes foram renovadas. Seja como for, se o futuro presidente conseguir, haverá uma perspectiva muito positiva para o país. E, por consequência, para os Estados, afinal estamos em uma federação, ou seja, todos no mesmo barco. Caso contrário, não sei o que vai acontecer. O eleitor fez sua parte ao mostrar que está insatisfeito. O presidente montou duas equipes, uma para a economia e outra para segurança e Justiça, exatamente para ir ao encontro do desejo do povo. Uma pode impulsionar a retomada dos empregos e outra o enfrentamento da insegurança.
A escolha da equipe econômica, com economistas que tiveram formação na Escola de Chicago, que se notabiliza pelo liberalismo, foi acertada?
Foi a mais acertada para o momento. O bem-estar, o emprego e a renda não têm ideologia. Pode ser de esquerda, de direita, liberal ou não. Independente destas questões ideológicas, a população quer voltar a ter uma expectativa, reconquistar o que já teve. Os mais atingidos pela situação [da crise na economia do país] foram aqueles que chegaram a um patamar de vida razoável, ou seja, à classe média ou, estando na classe média, melhoraram. Mas [com a crise] caíram de padrão. Apenas não caíram de padrão os que estão no pico da pirâmide ou os que têm renda [proveniente] do Bolsa Família. Mas os demais caíram [o nível de consumo]. E não se conformam de terem alguma coisa em um dia e, no noutro, não mais. Deixaram de ter dinheiro para as férias, para uma viagem com a família... Se ele conseguir reabilitar [o crescimento da renda e do emprego], fará o que o país quer. Claro que até chegar onde já estivemos, vai demorar. Precisará de dois ou três governos. O “muro” era muito forte, o entulho é grande para tirar de uma hora para outra.
Como deve ser a relação do governo federal, particularmente da nova equipe econômica, com os Estados, que estão em situação quase de calamidade fiscal?
Deve ser uniforme. Não pode discriminar. Se discriminar, estará errado. Mas uns precisam de uma ajuda maior, dependendo do grau da “doença”. O Espírito Santo, por exemplo, não precisa de nada. Fez o dever de casa e está equilibrado há muito tempo. Tem dinheiro para investir, está se desenvolvendo, sem atraso nenhum. Evidentemente que a situação calamitosa está no Rio de Janeiro. Calamitosa nas finanças, na segurança e na corrupção. Esse é, pelo que vejo, o pior caso. Mas tem o Rio Grande do Sul em má situação. Minas Gerais, também. E Rio Grande do Norte, em péssima situação. Mas [a ajuda do governo federal] tem que ser mais ou menos uniforme. Isso não é fácil de fazer, porque exige recurso. O país não tem essa disponibilidade. Os recursos só estarão disponíveis se houver as reformas, principalmente as da Previdência, a tributária e a política.
Então, tocar essas reformas seria a principal contribuição do próximo presidente aos Estados?
Quando se diz “tocar as reformas”, um dos itens básico é privatizar o que pode ser privatizado para deixar de tirar do tesouro do Estado. Com isso, haverá caixa para investimentos. Aqui, tivemos o caso típico da Cosern, que vivia do caixa do Estado e não recolhia ICMS. Privatizada, deixou de receber recursos públicos e ainda ajuda a suprir o Estado com a contribuição dos tributos, que a certa altura foi suficiente para todo o custeio da Educação. O governo do PT aceita isto?
A privatização da Caern seria uma das medidas para enfrentar a crise do Estado?
Em parte. O Estado está com um buraco tão grande, que só a Caern privatizada não consegue tapar. Quando a Cosern foi privatizada, os recursos não foram para tapar buraco. Foram para investir em algo que assegurou ao Rio Grande do Norte o que está aí com as adutoras. O Estado tem uma rede de adutoras muito grande. Na época, construiu estrategicamente obras de recursos hídricos. Assegurou a conclusão da Barragem Santa Cruz (no município de Apodi, região Oeste) e depois o Estado foi ressarcido. Se não fossem essas obras, a seca teria consequências ainda mais graves. Também foi usado [recursos da privatização da Cosern] na reforma e ampliação do Aeroporto de Parnamirim. Poucos lembram mas não havia voos internacionais por falta de condições do aeroporto. O investimento feito melhorou essa infraestrutura. Hoje, se privatizar a Caern talvez não dê nem para o buraco da Previdência. A situação, então, está pior.
Ficou mais difícil conseguir enfrentar a crise do desajuste fiscal do Estado?
Sei que [o governo] está fazendo leilões de bens imóveis e tinha que fazer. Não faz sentido ter bens imóveis [do Estado] em Natal. A Caern seria a “joia da coroa”. Mas a privatização precisaria de requisitos, entre os quais ter uma agência reguladora que faça cumprir as normas e preserve a função social [na atuação da empresa que presta o serviço público].
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