quinta-feira, 4 de abril de 2019

Polícia Federal encontrou provas de corrupção na delegacia do Caso Marielle

Da redação com UOL
Por Leandro Prazeres, Flávio Costa e Sérgio Ramalho
Do UOL em Brasília e em São Paulo, e colaboração para o UOL, no Rio
A PF (Polícia Federal) encontrou provas de que houve atos de corrupção praticados por membros da DH (Delegacia de Homicídios da Capital) que impediram o esclarecimento da autoria de assassinatos que envolvem milicianos do "Escritório do Crime" e integrantes da máfia do jogo do bicho no Rio de Janeiro.

A informação foi confirmada ao UOL por duas fontes ligadas ao inquérito da PF que apura se houve obstrução à investigação sobre a morte da vereadora Marielle Franco (PSOL) e do motorista Anderson Gomes -- crime ocorrido em 14 de março de 2018. A reportagem apurou que ao menos dois delegados estariam na folha de pagamento do "Escritório do Crime". A propina era paga na própria sede da DH, localizada na Barra da Tijuca (zona oeste do Rio).

Após a conclusão do Caso Marielle, os policiais federais vão focar no desbaratamento da relação promíscua que une integrantes do crime organizado e agentes da segurança pública do estado.

Pelo menos oito inquéritos da DH estão sob análise da PF por determinação da PGR (Procuradoria-Geral da República). Além do caso Marielle, também estão submetidas à varredura federal as investigações sobre as execuções de dois herdeiros de clãs da máfia do jogo do bicho: Hayton Escafura e Myro Garcia, assassinados em 2017. Esses e outros crimes são atribuídos à milícia conhecida como "Escritório do Crime".

Durante sua investigação, a PF analisou se o grupo criminoso contava com infiltrados dentro da DH, conforme depoimentos de dois delatores ouvidos por procuradores da República. Procurada por email para comentar a investigação da PF, a Polícia Civil do Rio não respondeu à reportagem.

"Escritório do Crime" pagava mesada, diz delator

Um dos delatores, o ex-PM Orlando Oliveira de Araújo, o Orlando Curicica, apelido em referência ao bairro onde ele chefiava uma milícia na zona oeste do Rio, afirmou em depoimento que integrantes do "Escritório" pagavam uma mesada a alguns policiais da DH para que investigações sobre as execuções praticadas pelo grupo paramilitar não chegassem aos responsáveis pelos crimes.

Além de Curicica, um segundo delator --um homem que sobreviveu a uma tocaia do grupo de matadores de aluguel - afirmou que há infiltrados entre os agentes que atuam na delegacia especializada.

Relação entre milicianos e políticos: "aliança satânica"

A suposta relação entre milicianos e políticos com o assassinato da vereadora do PSOL e seu motorista chegou a ser comparada, em novembro passado, pelo então ministro da Segurança Pública, Raul Jungmann, a uma "aliança satânica". O ministro se referia às relações promíscuas envolvendo policiais ligados a grupos paramilitares que praticam crimes (também chamados de milícias), sobretudo assassinatos, a soldo de políticos e clãs da máfia da contravenção carioca.

As investigações apontam o "Escritório do Crime" como principal grupo paramilitar envolvido em crimes de pistolagem (assassinato sob encomenda) no estado. Esta milícia é formada por policiais e ex-policiais treinados em unidades de elite da polícia, em especial o Bope (Batalhão de Operações Especiais) da Polícia Militar. Passou pela unidade o sargento PM reformado Ronnie Lessa, apontado pela DH como quem efetuou os disparos que vitimaram Marielle e Anderson.
Lessa é sniper (atirador de elite) e instrutor de armamento treinado pela tropa de elite de onde também saiu o ex-capitão PM Adriano Magalhães da Nóbrega, citado como chefe do "Escritório do Crime", milícia de Rio da Pedras, na zona oeste do Rio, em investigações do Ministério Público estadual. Ex-companheiros de farda, os dois "ex-caveiras" também têm em comum um histórico de serviços prestados a dois dos principais clãs da máfia da contravenção no Rio. Lessa nega ter participação no assassinato de Marielle e Anderson.

Adriano foi expulso da PM por trabalhar como segurança para membros da família de Waldomiro Paes Garcia, o Maninho, assassinado em 2004. Ele está foragido.

A ação de infiltrados pode explicar a razão de Adriano ainda não ter sido capturado e outros vazamentos de operações policiais no Rio. O próprio Lessa, após ser preso, admitiu que recebeu informação de que estava sendo investigado.

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