MARIANA HAUBERT
NATÁLIA CANCIAN
DE BRASÍLIA
NATÁLIA CANCIAN
DE BRASÍLIA
Após uma ampla força-tarefa conduzida pelo governo e por parlamentares ligados aos direitos humanos, a Câmara dos Deputados rejeitou na madrugada desta quarta-feira (1º) a proposta de emenda à Constituição que reduz a maioridade penal de 18 para 16 anos para crimes graves por apenas cinco votos.
Em uma decisão apertada, 303 deputados votaram favoravelmente à proposta, 184 votaram contra e 3 se abstiveram. Apesar da maioria de votos a favor, as regras da Câmara determinam que uma PEC, por fazer mudanças na Constituição, precisa de um mínimo de 308 votos favoráveis para ser aprovada.
Mesmo com a rejeição do projeto, a Casa ainda poderá votar em plenário a proposta original da PEC –que reduz a maioridade penal não só para crimes graves, mas para qualquer tipo de crime. Segundo o presidente da Casa, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), isso deve acontecer apenas na semana que vem ou pode ficar para o segundo semestre.
O projeto rejeitado nesta quarta foi patrocinado pelo presidente da Casa, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), que deu celeridade a sua tramitação.
Ele havia sido resultado de uma negociação com deputados tucanos. O texto que serviu de base do acordo foi feito pelo senador Aloysio Nunes Ferreira (PSDB-SP).
O texto analisado visava alterar a Constituição para reduzir a maioridade penal de 18 para 16 anos para crimes hediondos (como estupro e latrocínio) ou equiparados (como tráfico de drogas), homicídio doloso (quando há intenção de matar), roubo qualificado (quando há uso de arma de fogo, por exemplo) e lesão corporal grave ou seguida de morte.
Antes da votação, Cunha disse, no entanto, que não se preocupava com o resultado da votação. "O fato de eu ter opinião e ela não ser necessariamente a que a maioria, no momento, possa ter, eu não me sinto derrotado. Eu quero discutir, debater, votar. Isso que faz a essência do Parlamento", disse.
"Fico feliz que conseguimos levar à votação, apesar de todos os contratempos. Foi uma sessão histórica, importante. O fato de não ter passado, apesar de o governo ter trabalhado contra e ter tido todo tipo de movimentação, foram 303 votos, o que é muito representativo. Que mostra que o tema é polêmico", disse ao final da sessão.
'BOMBA'
Cunha contou com apoio das bancadas evangélicas e da bala e de parte da oposição (como PSDB e DEM).
PT, PSB, PDT, PC do B, Pros, PPS, PV e Psol encaminharam suas bancadas para votar contra a proposta.
O governo Dilma Rousseff (PT) atuou para convencer a base aliada pela rejeição da proposta. Durante a manhã, os líderes da base se reuniram no Ministério da Justiça com José Eduardo Cardozo, titular da pasta, e com Pepe Vargas (Direitos Humanos).
Cardozo afirmou que a aprovação seria uma "bomba atômica" no sistema prisional e poderia levar a alterações de outras leis, como a da permissão para dirigir.
O governo vinha nos últimos meses reforçando a divulgação de estatísticas sobre a criminalidade juvenil na tentativa de influenciar a opinião pública contra a redução da maioridade.
E passou a defender mudanças só no ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente), para aumentar a punição para menores que praticam crime violento e para adultos que aliciam ou cooptam jovens.
Para o líder do governo na Casa, José Guimarães (PT-CE), o resultado da votação mostrou que é preciso focar na reforma do ECA. De acordo com ele, o governo irá trabalhar para instalar uma comissão especial na Casa para debater a ideia. "Não há derrotados e nem vencidos. O que há é uma manifestação explícita de querermos reformar o ECA e não de constitucionalizar a questão da redução. Prevaleceu o bom senso", disse.
O petista afirmou que o governo pretende dialogar com a sociedade para sinalizar que haverá mudanças para punir com mais rigor quem "comete delitos contra a vida".
Para garantir que a discussão sobre a proposta não se estendesse madrugada adentro, foi acordado que 10 deputados falassem contra a redução e 10 falassem a favor. Ainda assim, a discussão e a votação da matéria demoraram mais de quatro horas.
Deputados da bancada da bala e outros que defendiam a redução da maioridade, chegaram a subir na área da mesa da presidência da Câmara para acompanhar o fim da votação. Após o resultado, manifestantes contrários à redução comemoraram na galeria do plenário com gritos de "não, não, não à redução" e "Cunha ditador".
Editoria de Arte/Folhapress |
DEBATE
Os deputados contrários à redução defenderam, principalmente, que a alteração na Constituição iria criminalizar ainda mais a população jovem negra e pobre do país. "Nós somos legisladores, não vingadores. É uma medida ineficaz e atinge a população pobre, negra e excluída", afirmou o deputado Ivan Valente (Psol-SP).
"Essa proposta poderá colocar os mais jovens no caminho dos crimes, das drogas e da pedofilia", criticou o líder do PT, Sibá Machado (AC).
"Hoje no país se uma pessoa tem uma porção de maconha na mão, quem vai dizer se ele é traficante ou não é o policial. Se ele for negro, ele vai ser enquadrado como traficante. Se for de branco e de classe média, como usuário", defendeu o deputado Paulo Teixeira (PT-SP).
Já os que queriam a redução da maioridade penal, justificaram sua posição ao alegar que atualmente grande parte dos crimes no país é cometido por menores de 18 anos, que muitas vezes são usados por adultos. "Quem sequestra, tortura e mata, não é criança, é criminoso", afirmou Marcos Rogério (PDT-RO).
"O ECA [Estatuto da Criança e do Adolescente] é fraco, não pune, tanto é que, após atingir a maioridade penal, esse marginal sai com ficha limpa independentemente dos crimes bárbaros que tenha praticado", afirmou o deputado Capitão Augusto (PR-SP).
O texto analisado tinha o objetivo de alterar a Constituição para reduzir a maioridade penal de 18 para 16 anos para os seguintes crimes: hediondos (como estupro, latrocínio, falsificação de medicamentos e prostituição de crianças e adolescentes) ou equiparados (tráfico de drogas, tortura e terrorismo), homicídio doloso (quando há intenção de matar), roubo qualificado (quando há uso de arma de fogo ou quando é praticado por duas ou mais pessoas, entre outros pontos), lesão corporal grave e lesão corporal seguida de morte.
O projeto que serviu de base para o acordo foi feito pelo senador Aloysio Nunes Ferreira (PSDB-SP).
TUMULTO E SENHAS
A sessão, que durou cerca de quatro horas, foi antecedida por tumulto e gritos de ordem entre manifestantes contrários e a favor da redução da maioridade.
Segundo estudantes, a polícia usou gás de pimenta. Favoráveis à redução gritavam "bandido é na prisão", enquanto os contrários rebatiam: "Não à redução, queremos mais saúde e educação".
O presidente da Casa, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), determinou a distribuição de senhas para os partidos de acordo com o tamanho de cada um para o acompanhamento da votação na galeria do plenário.
Um grupo de 60 estudantes vinculados à UNE (União Nacional dos Estudantes) foi impedido de acompanhar a votação. Eles obtiveram um habeas corpus do Supremo Tribunal Federal, assinado pela ministra Carmem Lúcia, autorizando seu ingresso na galeria.
No entanto, Cunha afirmou que a decisão da Corte definia apenas que ele mantivesse a ordem na Casa. "A [decisão] que eu recebi, podem ter outras que eu não tenha recebido, tem que ser de garantia da ordem. E eu estou garantindo", disse.
Estudantes protestaram. "Nos disseram que foram distribuídas 200 senhas para os partidos mas são 300 lugares. Nossa senha é essa", disse o estudante Mateus Weber, 20, da UNE, enquanto mostrava o habeas corpus.
Durante a confusão, o deputado Heráclito Fortes (PSB-PI) foi empurrado e caiu quando tentava chegar ao plenário da Casa. "Os manifestantes estavam dizendo que eu não ia poder entrar e me empurraram. Eu nem sei de que lado eles estavam. Isso é um desrespeito à liberdade e à democracia", afirmou.
Fonte: Folha de São Paulo
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