quinta-feira, 11 de outubro de 2012

Processo contra Lula não prospera

São Paulo (AE) - Não há consenso sobre a possibilidade de investigação do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, diante das condenações pelo Supremo Tribunal Federal (STF) de integrantes da alta cúpula do PT no processo que ficou conhecido como mensalão. Dois especialistas ouvidos pela Agência Estado refutam um eventual processo contra o ex-presidente, enquanto um admite a possibilidade de que o reconhecimento do mensalão pelos ministros da corte reforça o entendimento de que o ex-presidente tem participação no esquema. Na terça, dia da condenação do ex-ministro da Casa Civil José Dirceu por corrupção ativa, líderes da oposição reforçaram a postura favorável à abertura de uma representação contra Lula para que se investigue sua relação com o mensalão.
 Tasso Marcelo
 Condenação de Dirceu reforçou a proposta do PSDB de entrar 
com uma representação na Procuradoria da República contra Lula

 Para o criminalista Luiz Flávio Gomes, é necessário ter "um mínimo de prova" contra Lula para investigá-lo. O ex-ministro do STF Francisco Rezek também acredita não ser possível julgar o petista por envolvimento com o esquema. "Eu não creio que o procurador-geral da República tenha recolhido elementos para formular uma acusação contra qualquer pessoa que já não estivesse envolvida no processo", afirmou Rezek. "Qual o mínimo de prova que se tem contra ele? Como chegou até o chefe do gabinete da Casa Civil, também poderia, teoricamente, chegar nele, porém é necessário ter um mínimo de prova", complementa Gomes.

De acordo com Rezek, cogitar uma representação contra Lula baseada na condenação de Dirceu é uma "argumentação política". "Acho perfeitamente natural que a oposição argumente dessa maneira, mas como operador do direito absolutamente isento, à luz dos princípios que orientam o processo penal do Brasil, não vi como evidente que o comando pudesse estar acima do próprio chefe da Casa Civil", reforçou.

Para o ex-ministro do STF, a absolvição do ex-deputado federal Luiz Gushiken e de outros réus no processo por falta de provas é uma amostra de que a denúncia do Ministério Público englobou todos os possíveis envolvidos no esquema. "A denúncia já procurou ser completa. Por tudo que se ouviu no plenário do STF, não acho que o procurador tenha recolhido elementos para fundar uma acusação sólida contra qualquer pessoa que já não estivesse ali", reiterou. Gomes destaca a necessidade da existência de provas: "Em relação ao José Dirceu, pode-se discutir se a prova é mais intensa ou menos, mas o mínimo tem. No caso do Lula, é preciso saber se há esse mínimo de prova, do contrário não se instaura nada".

O professor de direito da Fundação Getúlio Vargas (FGV) e da Universidade de São Paulo Ronaldo Porto Macedo Junior diverge dos dois juristas. Para ele, é possível que haja investigação e eventual denúncia contra o ex-presidente, caso o procurador geral da República reúna indícios capazes de formar seu convencimento. "Durante o processo foram produzidas novas provas. Se ele (procurador-geral da República) entender que essas novas provas são suficientes para envolver o ex-presidente Lula, poderia fazer uma nova denúncia", disse. "A condenação consolida uma convicção de que houve mensalão."

De acordo Macedo, a existência de indícios que relacionam Lula com o esquema é mais importante do que a própria condenação de Dirceu. "Não é a condenação em si (que pode ensejar uma nova denúncia), mas os indícios que justificaram a condenação, as evidências", completou. Segundo o professor, uma evidência pode se tornar mais robusta com o andamento do julgamento. "Se o procurador-geral da República entender que já há indícios de que o presidente Lula pode ter participado disso (mensalão), pode determinar que se investigue."

Ainda que o ex-presidente fosse investigado e, posteriormente, a Procuradoria-Geral da República o denunciasse, algumas questões técnicas poderiam retardar seu julgamento. Em primeiro lugar, há divergência sobre a possibilidade de Lula ser julgado pela Justiça comum, já que não possui mais foro privilegiado, ou pelo STF, pois teria coordenado esquema com agentes julgados pela suprema corte. Além disso, corre o prazo prescricional do mensalão, esquema que se desenrolou em 2005. O ex-presidente completa, neste mês 67 anos. Ao alcançar os 70 anos, tem-se ainda reduzido o prazo prescricional.

Dirceu é condenado por 8 a 2

Brasília (AE) - O presidente do Supremo encerrou o julgamento do capítulo sobre corrupção ativa condenando o ex-ministro José Dirceu, o ex-presidente do PT José Genoino e o ex-tesoureiro do partido Delúbio Soares, além de Marcos Valério e mais quatro pessoas ligadas ao empresário. Com este voto, Delúbio e Valério foram condenados por unanimidade; em relação a Dirceu o placar para condenação foi de 8 votos a 2, com apenas os ministros Ricardo Lewandowski e Dias Toffoli tendo votado pela absolvição.

Na fundamentação de seu voto, o presidente destacou que a base aliada ao primeiro governo Lula foi montada mediante pagamento de propina. "O que é estranhável, lamentável e catastrófico é que partidos foram açambarcados por um deles, o (partido) que fez (que elegeu) o chefe do Poder Executivo, para uma aliança perene e incondicionada no sentido de votar todo e qualquer projeto de interesse do Executivo", disse. "É um estilo de coalizão excomungado pela ordem jurídica brasileira, quando as alianças, os acordos se fazem à base de propina, de suborno, de corrupção", ressaltou, observando que o esquema teria movimentado R$ 153,7 milhões.

Britto afirmou que o alinhamento "incondicional" de um partido a outro desfigura a "ideologia das urnas" e afirmou que o parlamentar corrompido trai a população. "Compra-se a consciência do parlamentar propinado, subornado, corrompido, que trai o povo inteiro porque trai o mandato popular". Afirmou ainda que, além do voto, o parlamentar tem a função de fiscalizar o Executivo e corrompido abdicaria dessa atribuição. "É a mais danosa das omissões". Ao falar sobre os réus, aproveitou para refutar a hipótese de se levar a biografia dos acusados em conta na hora das condenações e absolvições. 

José Genoíno pede demissão do Governo

São Paulo (AE) - Condenado pelo Supremo Tribunal Federal por corrupção ativa, o ex-presidente do PT José Genoino pediu ontem demissão do cargo de assessor especial do Ministério da Defesa. Ex-presidente do PT (2003 a 2005), Genoino anunciou a renúncia durante reunião do Diretório Nacional da agremiação ao ler Carta Aberta ao Brasil, na qual diz que o STF errou e transformou "ficção em realidade" no julgamento do mensalão. 

"Retiro-me do governo com a consciência dos inocentes. Não me envergonho de nada. Continuarei a lutar com todas as minhas forças por um Brasil melhor, mais justo e soberano, como sempre fiz", disse Genoino. Com a voz embargada e mãos trêmulas, ele cravou que o Supremo cometeu uma "injustiça monumental". "A Corte foi, sobretudo, injusta. Condenou um inocente, condenou-me sem provas." Ele se disse "indignado".

Em almoço com o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva ontem, em São Paulo, a presidente Dilma Rousseff manifestou preocupação com Genoino. Mesmo que ele não entregasse o cargo, seria obrigado a sair do governo no fim do julgamento, por causa da condenação no Supremo.

Aplaudido por 90 dirigentes e convidados na reunião do diretório, Genoino emocionou-se. Companheiros de partido o saudaram com o refrão. "Genoino, guerreiro, do povo brasileiro". "Sem provas para me condenar, basearam-se na circunstância de eu ter sido presidente do PT. Isso é o suficiente?", ele perguntou na leitura da carta aberta, recheada de adjetivos fortes.

Genoino não citou a palavra mensalão. Disse, porém, que o julgamento ocorreu em meio a uma "diuturna e sistemática campanha de ódio" contra o PT e contra um "projeto político exitoso", que, na sua avaliação, "incomoda setores reacionários, incrustados em parcelas dos meios de comunicação, do sistema de justiça e das forças políticas".  Genoino argumenta que houve "criminalização da política" e criticou a adoção pelo STF da teoria do domínio funcional do fato. "Construiu-se uma acusação escabrosa que pôde prescindir de evidências, testemunhas e provas", afirmou o petista. "Baseada na teoria do domínio do fato que, nessas paragens de teorias mal digeridas, se transformou na tirania da hipótese pré estabelecida."

Barbosa é eleito presidente do STF 

Brasília (AE) - Com nove votos a favor e um contra, o ministro Joaquim Barbosa foi eleito ontem presidente do Supremo Tribunal Federal (STF) pelos próximos dois anos. Relator do processo do mensalão, Barbosa assumirá a presidência da Corte em novembro, com a aposentadoria compulsória do ministro Carlos Ayres Britto. A escolha ocorre um dia depois de o tribunal ter formado maioria para condenar o ex-ministro chefe da Casa Civil José Dirceu, principal réu do mensalão, por corrupção ativa. Pela tradição do colegiado, o ministro não vota em si mesmo, mas vota em seu futuro vice-presidente. Por isso ocorreu um voto contrário. Em seguida, Ricardo Lewandowski foi eleito para a função de vice-presidente.

Coube ao ministro Celso de Mello, o decano do tribunal, saudar a eleição de Barbosa. Para Mello, a escolha de Barbosa manteve a tradição da Corte de escolher seu próprio presidente. O ministro lembrou que nem sempre o "autogoverno" do Supremo prevaleceu na história do tribunal. "Tenho certeza de que, agindo com sabedoria, prudência e segurança, (Joaquim Barbosa) saberá superar os obstáculos", destacou o decano.

Em seguida, o procurador-geral da República, elogiou a escolha de Barbosa. Da tribuna, o advogado Roberto Caldas, juiz da Corte Interamericana de Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos (OEA), também homenageou, "em nome da classe dos advogados", a eleição de Barbosa. Segundo Caldas, certamente o ministro terá "sabedoria" para conduzir os trabalhos do Supremo.

*TRIBUNA DO NORTE/AE

Nenhum comentário:

Postar um comentário